Blog da Tum

A saída de Nésio da atenção primária, os afoitos por cargos e o dilema da esquerda

Articulação de setores do próprio PT para rifar Nésio do comando da Secretaria de Atenção Básica e seu orçamento bilionário expõe um modus operandi autodestrutivo da esquerda

Crédito: Walterson Rosa/MS

Decifra-me, ou te devoro. A máxima vem da filosofia grega e era o dilema da esfinge de Tebas, decifrada apenas por Édipo.

 

Assim como a esfinge desafiava os viajantes que passavam por ela e cobrava um alto preço a quem não a decifrasse - a própria vida -, a esquerda brasileira vive seu dilema para as próprias eleições.

 

O desafio da esfinge é entender o eleitorado brasileiro na sua essência, compreender o momento atual e se pautar pelo que realmente importa: a solução de problemas básicos do dia a dia da população.

 

As pautas prioritárias continuam as mesmas: a oferta de um sistema de saúde cada vez mais eficaz, as vagas necessárias para as famílias trabalhadoras deixarem suas crianças nos CMEIS, a escola de qualidade que pode levar o filho do pobre à universidade, a capacitação de jovens para o mercado de trabalho. A pesquisa e a inovação que podem transformar cenários de pobreza extrema e amenizar as desigualdades sociais.

 

O dever de casa é simples, mas fica difícil de se fazer quando a própria esquerda se digladia e se dilacera na busca pela hegemonia nos espaços de poder apenas para um grupo. A famosa guerra de egos e briga por cargos.

 

Não é segredo para ninguém que o PT, partido do presidente Lula, tenha os melhores cargos, o maior espaço, a primazia no governo do comandante que todos nós ajudamos a eleger. O problema é a sede por mais e mais espaço no governo, no comando de orçamentos bilionários, nem que custe o sacrifício de companheiros e de políticas públicas bem planejadas e executadas.

 

Também não é segredo para ninguém nos bastidores do governo Lula de que foi a ânsia de setores do PT por cargos que tirou do comando da Atenção Primária no Brasil, o médico sanitarista Nésio Fernandes, numa rasteira que tentou-se atribuir ao comando do deputado Arthur Lira. Devolvida pelo mesmo ao colo da ministra Nísia Trindade - ela própria emparedada pelas pressões do centrão - para que explicasse ao PCdoB nacional a articulação que levou o adjunto de Nésio ao comando da Secretaria Nacional de Atenção Primária.

 

Mesmo defendido em sua ação nos bastidores por outros setores do PT, a saída de Fernandes foi orquestrada pelo grupo ligado ao Ministro Padilha.

 

Na live que fez sobre o período que passou, Nésio foi extremamente elogioso à ministra, mantendo sua posição de leadade ao presidente Lula e à equipe a qual integrou. Ele tem evitado entrevistas e não quis comentar a saída com o blog.

 

Felipe Proenço, do PT e ligado ao ministro Alexandre Padilha, passa a comandar os mais de R$ 60 bi do orçamento deste ano para a Atenção Primária. Não pesa sobre Nésio nenhuma mácula profissional. Estava entregando resultados acima de 90%, como deixou claro na Live da Gratidão que fez em seu perfil no final da semana passada. A saída gerou uma nota de explicação sem explicação.

 

O fogo amigo coloca uma questão sobreposta a outra: companheiros se sabotando na busca por mais holofotes, poder e evidência.

 

A outra questão: a sanha desenfreada por cargos pode colocar a esquerda diante de um esvaziamento nas urnas, já que seus principais nomes estão bem empregados em importantes cargos da estrutura governamental.

 

É o que se vê, por exemplo, em Palmas. Os nomes mais competitivos do Partido dos Trabalhadores, testados nas urnas, estão ocupando cargos importantes dos quais não querem abrir mão para irem às ruas em busca de votos.

 

E sem votos suficientes para garantir mandatos, sem gastar sola de sapato, dialética das ruas e ocupação de espaços estratégicos na sociedade, ficará difícil chegar a 2026 com candidaturas fortes e competitivas para ocupar o Congresso Nacional.

 

É lá que a direita, que ressurge forte nas ruas em apoio a um mandatário que visivelmente desrespeita a lógica da democracia e gestou um golpe, continua comandando o imaginário do eleitor brasileiro mediano com sua pós verdade e fake news.

 

Se eu fosse o Comandante a ordem era uma só: deixem os cargos e ocupem as ruas, as associações, os sindicatos, as feiras, as praças e os mercados. A internet nossa de cada dia não ganha sozinha os embates eleitorais.

 

É preciso furar a bolha, mostrar trabalho. E, sobretudo, parar de “sacanear”os companheiros de luta.

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