Venho tentando entender nas últimas semanas, o curioso caso da contratação pelo Governo do Tocantins, via Setas, no apagar das luzes do ano que terminou, com dispensa de licitação, de uma fundação baiana para execução do programa TO Mais Jovem, que teria como objetivo capacitar e colocar no mercado de trabalho, 6 mil jovens tocantinenses.
Não a contratação em si, ou o modus operandi da Setas que alterou um edital, para retirar dele exigências legais. Está muito claro que toda esta estratégia visou eliminar do processo de seleção outras empresas, do Tocantins ou de fora dele, escolhendo uma por motivos que não me cabe adentrar. Ao custo, segundo o Tribunal de Contas do Estado, variando entre R$ 17 mil e R$ 35 mil por aluno, já que não estava claro também no processo se seriam 3 mil ou 6 mil jovens capacitados. Como não estava claro (leio no relatório) onde seriam distribuídos, com que critérios, pelos 139 municípios do Estado. Ou por menos.
O que intriga é: o governo Wanderlei Barbosa, que sucedeu Mauro Carlesse - que criou e propôs inicialmente o programa – está deixando passar a oportunidade de realizar um programa de inclusão de jovens tocantinenses no mercado de trabalho, na virada da metade de um ano, que pode se perder pela característica de ser um ano de disputa eleitoral.
O que está faltando? Compromisso com a pauta social? Vivemos num estado empobrecido ainda mais pelas consequências de uma pandemia que tirou adolescentes da escola, por motivo superveniente (afinal a vida é bem essencial e se tratava de preservá-la diante da ação desconhecida e desastrosa do coronavírus) gerando uma série de consequências na vida destes jovens.
O Tocantins que vivemos hoje está mais pobre. Nas maiores cidades, a pandemia sacrificou negócios, fechou portas, retirou milhares de pessoas do mercado formal de trabalho. Mas, Tocantins a dentro, o estrago é muito maior. Em dias normais, em tempos normais, estes jovens, sem capacitação, sem nenhuma oferta de trabalho nos rincões do interior sofrido, já não tinham oportunidade. E agora? Quando até para os adultos com experiência a vida ficou mais difícil, mais cara a cada semana? Para onde vai a famosa geração “Locdown”?
Responsabilidade não é do TJ, nem do TCE, mas de agentes do governo
Ouvindo desde a semana que passou o governo, as empresas, gente que vive de capacitação, a explicação que grita mais alto para que o governo não resgate este programa é: ah, mas está paralisado por ordem do Tribunal de Justiça e do TCE...
Isto como se os tribunais fossem responsáveis pelo malfeito operado dentro da Setas em dezembro. É de pasmar pois não só o TO Mais Jovem está prejudicado (este suspenso por decisão do conselho que administra o Fundo Estadual da Pobreza), mas apenas na Setas, mais sete programas estão parados aguardando revisão.
E que revisão seria esta, questionei ao presidente do fundo, o secretário da Fazenda? Teria que ser feita uma análise sobre a viabilidade/ oportunidade de retomar, se ainda são úteis ou necessários neste quadro...
Vejam bem, isso depois do fim da pandemia ter sido decretado com a volta das aulas presenciais na rede pública desde o começo do ano, da revogação do uso de máscaras, do aumento da taxa de vacinação e queda da média móvel de casos. Por que motivos esta análise ainda não foi feita?
É uma inoperância sem paralelo.
“Ah, mas o governo tem razão, não dá para tocar um processo viciado”, podem argumentar alguns. De fato. Se ficar preso no processo viciado.
Lendo a liminar concedida pelo juiz William Trigilio a um centro espírita que questionou a mudança do Edital, a retirada de pré-requisitos que a Flem, da Bahia não tinha, fica claro que toda a irregularidade do processo está nesta contratação. Se arquivar o processo, pondo fim ao contrato em ato administrativo - o que o governo ainda não fez – tanto a liminar do TJ, quanto a recomendação do TCE, perdem o objeto... Ou não?
Erros iniciais parecem ditar paralisia de decisões
Na verdade, os desgastes sofridos pelo governo com matérias colocadas e retiradas da pauta da Assembléia, ou os recuos que sempre ocorrem quando uma categoria forte em votos é desagradada, parece estar ditando uma certa paralisia nas ações do governo.
É notória uma dificuldade de decisão nesses meados do mês de maio. Bem diferente do governador forte e seguro dos dois primeiros meses de governo interino, que decidiu abrir o cofre e começar a pagar direitos dos servidores.
Em que pese ter feito tudo o que já fez, Wanderlei Barbosa precisa ousar mais. Precisa ousar resgatar da periferia da vida cidadã esses jovens esparramados pelo Estado e que não têm a quem recorrer. Gente para quem ganhar mil reais por mês fará a diferença agora e para o seu futuro. Permitirá o resgate da fome e a possibilidade do sonho.
Estes infelizmente não têm poder de pressão. Falando com o secretário Júlio Edstron esta semana, brinquei: “é muito dinheiro parado neste fundo!”. Ao que ele respondeu: “a senhora não diga isso que aumenta a pressão aqui sobre nós”. Ao que respondi e reafirmo: esta é a nossa função na imprensa.
Que o governo tenha a coragem necessária para destravar tudo que está parado e pendente de execução no Fundo de Combate à Pobreza. Criado com o sacrifício de muitos consumidores tocantinenses, inclusive com aumento da taxação da conta de luz, lá atrás no governo Miranda. Ninguém gosta de aumento de impostos. Ainda mais quando não chegam a finalidade proposta.
Mas se estes milhões servirem para melhorar a vida da nossa juventude, já vai valer a pena!
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