STJ decide hoje se amante tem direito a receber pensão alimentícia

Especialistas dizem que decisão de hoje pode mudar os rumos sobre o conceito de família no país...

Superior Tribunal de Justiça
Descrição: Superior Tribunal de Justiça Crédito: Da Web

Ele é casado e sustentou a amante por 30 anos. Então, os dois se separaram, e agora ela quer que ele pague uma pensão. Esse é o caso que será julgado nesta terça-feira no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a partir das 14h, e que poderá mudar o rumo sobre a concepção de família no Brasil.

Segunda família, família paralela, família simultânea: as palavras reforçam um conceito novo presente nas histórias de ações vencidas por amantes em luta por seus direitos em tribunais estaduais. Em Brasília, porém, o dogma do grupo familiar monogâmico resiste e enfraquece reivindicações da terceira pessoa envolvida.

Os defensores do avanço dos direitos dessa terceira pessoa lembram das conquistas dos homossexuais para sugerir que somente o tempo impede que Brasília passe a aceitar as mudanças também na questão dos amantes. Já os detratores da ideia consideram que o conceito de família monogâmica é imbatível. Há várias decisões sobre o assunto no país. No ano passado, a Justiça de Goiás decidiu que uma viúva deveria dividir a sua pensão com a amante do marido, morto em 1994. A “outra” anexou ao processo fotos e documentos para provar a relação extraconjugal, que durou 15 anos, e o exame de DNA da filha que os dois tiveram. A dependência econômica da amante foi usada pelo juiz como pilar da decisão.

 

Estado é pioneiro em decisões favoráveis

Ao contrário, o STJ tem mantido postura mais conservadora. Também em 2012, o ministro Luis Felipe Salomão negou reconhecimento de união estável para efeito de recebimento de pensão a uma mulher. Ele argumentou que é possível a “coexistência de relações com vínculo afetivo e duradouro, e até com objetivo de constituir família, mas a legislação ainda não confere ao concubinato proteção jurídica no âmbito do direito de família”.

Salomão é o juiz que decidirá sobre o caso desta terça-feira. A autora da ação obteve vitória no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ao provar que dependia financeiramente do homem com quem viveu por três décadas. A pensão foi fixada em 20% dos rendimentos do réu.

Dois advogados e professores de Direito na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul têm posições contrárias sobre o assunto. O Estado é pioneiro em decisões favoráveis a amantes, salientam os advogados.

Rolf Madaleno lembra que, se o STJ decidir favoravelmente à amante, será posicionamento inédito:

— A segunda família é ilegal. A pessoa se envolve com outra sabendo que ela é casada por sua conta e risco. Eu defendo ainda a exclusividade das relações, o princípio da monogamia.

Letícia Ferrarini argumenta que “essa opinião do triângulo amoroso em que se sataniza a amante e se santifica a mulher é uma visão superada. A ideia da coitada da esposa cabe a nós dentro da família, mas não ao Estado, que tem de ser imparcial.”

 

Rolf Madaleno (Advogado e professor de Direito da PUCRS)

"Não há nenhum artigo de lei dizendo que a gente só pode ter uma pessoa, mas esse é o princípio presente na nossa cultura desde sempre."

 

Letícia Ferrarini (Advogada e professora de Direito da PUCRS)

"A ideia da coitada da esposa cabe a nós dentro da família, mas não ao Estado, que tem de ser imparcial para proteger, ao fim e ao cabo, a dignidade da pessoa humana."

 

EVOLUÇÃO DE LEIS

Decisões que avançaram no país

1916 – A Lei nº 3.071, de 1º de janeiro (antigo Código Civil), era uma obra moldada a sua época, de família patriarcal, casamento indissolúvel e distinção entre filhos legítimos e ilegítimos.

1949 – A Lei nº 883 tratou do reconhecimento de filhos ilegítimos, que passaram a ter direito a herança. Passou a ser proibida a menção à filiação ilegítima no registro civil.

1977 – A Emenda Constitucional nº 9 possibilitou o divórcio no país após obtenção da separação judicial.

1992 – A Lei nº 8.560 inovou ao regular a investigação de paternidade dos filhos fora do casamento. Isso legitimou ações de paternidade pedidas pelo Ministério Público.

2001 – Primeiro reconhecimento de união homoafetiva como união estável no país ocorreu no RS.

2005 – O Superior Tribunal de Justiça concedeu direito de pensão por morte em uniões homoafetivas.

2013 – Resolução do Conselho Nacional de Justiça determinou que os cartórios do país deverão aceitar casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.

 

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