Apesar das fortes evidências apresentadas pela Procuradoria-Geral da República e da gravidade dos fatos denunciados, o presidente Michel Temer não será sequer investigado pelos crimes de corrupção cometidos no exercício do mandato. Em votação plenária, 263 deputados federais decidiram pelo arquivamento da denúncia, cobrindo Temer com o manto da impunidade. Entre esses deputados, estão cinco dos oito integrantes da bancada do Tocantins na Câmara Federal: deputados Carlos Gaguim, Dulce Miranda, Dorinha Seabra, Josi Nunes e Lázaro Botelho.
A decisão dos 263 parlamentares brasileiros opôs-se frontalmente à vontade de 81% dos brasileiros, que desejavam o prosseguimento da denúncia, segundo pesquisa Ibope. É uma posição que gerará desgaste para os deputados. Mas isso parece ter sido compensado previamente, com a distribuição de cargos públicos, alívio de dívidas multimilionárias para ruralistas e com farta liberação de emendas parlamentares, cujos recursos irão irrigar os cofres de prefeitos aliados dos congressistas. E sabe-se lá quais outras benesses foram acertadas em conversas privadas com emissários do Planalto, em jantares suntuosos e em audiências a portas fechadas com o próprio presidente, conforme noticiado. Temer safou-se da denúncia criminal e de uma possível pena de prisão fazendo largo uso de dinheiro público.
Nos dias e semanas que antecederam a votação, parlamentares federais do Tocantins comemoraram publicamente o empenho e a liberação de emendas por parte da União. Anunciavam, com orgulho, novas obras para suas bases eleitorais. Paralelamente, a mídia nacional divulgava que a liberação de emendas federais ocorria em favor da blindagem de Michel Temer. Desde a apresentação da denúncia contra o presidente, ocorrida no final de maio, foram empenhados mais de R$ 2,3 bilhões em emendas, segundo dados da Agência Lupa.
Talvez os deputados federais apostem no obscurantismo político do brasileiro. Pensam que o cidadão deve comemorar a obra física que chega à sua cidade a partir das emendas, mas que deve relevar a abstração de um voto, entre centenas de outros, voltado a assegurar impunidade a um gestor corrupto.
Talvez os parlamentares apostem na memória curta do eleitor. “Até a eleição de 2018, terão esquecido o voto pela corrupção”, pensam. Como também terão esquecido os votos pelo congelamento dos investimentos públicos em saúde e educação e os votos em favor do desmonte dos direitos trabalhistas e previdenciários.
Talvez, ainda, os deputados acreditem na ignorância dos seus eleitores, os quais sentiriam os acontecimentos de Brasília como algo distante da sua realidade e não se interessariam por acompanhar o noticiário político e o resultado de votações do Congresso Nacional.
Seja qual for a hipótese, o quadro é de parlamentares que veem a população como uma força oponente aos seus interesses particulares e como uma massa a ser ludibriada. Nesse embate entre os representantes do povo e o próprio povo, os primeiros mostraram que são mais fortes. Não importa nossa ânsia por moralidade e Justiça. Não importa que, em meio à angústia e à vergonha de sermos brasileiros, ainda reste um fio de esperança. Sempre que quiser, eles poderão nos derrotar, fazendo prevalecer suas vontades.
Eles, os mesmos que gritaram palavras de ordem contra corrupção por ocasião do impeachment, mesmo que não houvesse acusação de corrupção na época. Eles, os mesmos que decidiram pela saída de Dilma Rousseff e que agora dizem que afastar um presidente da República seria prejudicial porque geraria instabilidade. Eles, os mesmos que diziam não haver mais condições de governabilidade para a petista, mas que decidiram manter no poder o peemedebista reprovado por 94% da população. Questões partidárias à parte, eles não têm o mínimo de coerência, de responsabilidade e colocam suas conveniências momentâneas acima de qualquer questão.
Fica aqui registrado o desabafo de um cidadão.
Flávio Herculano é jornalista no Tocantins.
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