A Lei 8.078 de 11 de setembro de 1990, foi criada numa era onde havia hiperinflação e deu voz a um importante agente econômico: o consumidor. Trouxe reconhecimento da vulnerabilidade e direito a informação como princípios basilares, bem como destacou o conceito de boa-fé objetiva propiciando um ambiente onde desenvolva a harmonia nas relações jurídicas de consumo e possibilitou maior acesso à Justiça. Neste contexto, outras leis e políticas públicas foram criadas ampliando o direito dos consumidores, no entanto, ainda há o que ser desenvolvido, haja vista que muitos dos direitos previstos nessa lei não são respeitados.
Há quem diga que o código de defesa do consumidor “não pegou”, embora trata-se de uma lei que serviu de exemplo para diversos países. Mesmo após 27 anos, ainda existem reclamações nos Procons e ações judiciais porque a oferta do produto ou serviço não foi adequada, porque houve omissão de algo importante ou simplesmente não houve cumprimento da oferta. Ainda há fornecedores de produtos e serviços que praticam conduta abusiva e ilegal reiteradamente, os acidentes de consumo não são tratados com a transparência que se espera e o prazo de arrependimento para compras fora do estabelecimento comercial não é respeitado. As empresas ainda não se organizaram efetivamente para consolidar a ideia de prevenção do dano ao consumidor por meio de melhor controle administrativo. Enfim, os 27 anos não foram suficientes para consolidar a responsabilidade do fornecedor na prestação do serviço, a proteção contratual nos contratos de adesão e ás leis do SAC, restando um sentimento de impossibilidade de solução, afetando a esperança em coibir abusos e de construir uma sociedade mais justa.
No entanto, é possível destacar vários avanços significativos, principalmente no que tange ao direito à informação como pressuposto da boa- fé nas relações de consumo, a institucionalização da Política Nacional das Relações de Consumo, a criação da Secretaria Nacional do Consumidor, o fortalecimento do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor e a instituição do Plano Nacional de Consumo e Cidadania. Valores como lealdade, respeito, transparência fazem parte do diálogo cotidiano das pessoas e empresas, consolidando a ideia de que há direitos que devem ser respeitados e instrumentos eficientes para defendê-los como por exemplo, os PROCONs e os Juizados Especiais Cíveis. Houve avanços também na legislação do comércio eletrônico como marco civil da internet e um aprimoramento dos anúncios publicitários para evitar que haja indução ao erro.
Sobre o futuro da relação entre fornecedor e consumidor, resta o desafio de acompanhar o dinamismo inerente aos hábitos de consumo a fim de mapear as possíveis demandas, atuando de modo mais preventivo do que repressivo, o mercado deve aprimorar a comunicação da oferta e investir para que o atendimento seja eficiente e o pós-venda esteja preparado para lidar com um consumidor cada vez mais empoderado, exigente e conhecedor de seus direitos. E ainda, é preciso avançar para uma proteção global do consumidor, exigindo normas e garantias internacionais para pôr fim à prática de duplo padrão de qualidade adotado por multinacionais.
É imprescindível destacar a importância dos consumidores buscar os órgãos de proteção para que possam rechaçar as práticas abusivas e alcançar um resultado administrativo ou judicial satisfatório para a melhoria das relações de consumo. Resta-nos a reflexão que quanto mais diálogos e participação social nos debates de temas controversos maior chance de preservar as conquistas e fixar o alicerce do respeito ao direito do consumidor num patamar irreversível.
Liliane de Moura Borges é especialista em Direito do Consumidor pela UCAM e Técnica em defesa do consumidor do PROCON Tocantins
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