Como lagartas, eles vivem se arrastando pelos corredores dos palácios de governo e casas legislativas. São mal vistos, pelo seu jeito de povo, pela pele encardida de sol, por suas roupas simples. Olha-se para eles de cima para baixo, considerados inoportunos pelos pedidos que os leva a rotineiros chás de cadeira nas antessalas dos gabinetes. E eles pedem de tudo aos políticos: cargos, passagens, remédios, uma ajudinha para isso e aquilo.
Esbarrou com um deles num supermercado, é pedido na certa. Encontrou na rua, novo pedido. Foi achado naquele velório de um velho correligionário onde ele sabia encontrá-lo, lá vem mais um... Ou então vem a cobrança por tudo que lhes foi prometido com um sorriso amarelo mas, naturalmente, não cumprido.
Mesmo inconvenientes, essas pessoas são recebidas nos gabinetes com um aperto de mão seguido de um tapinha nas costas. São saudadas, com falso entusiasmo, pela alcunha de “minha liderança”, que simula intimidade e valorização. Faz parte do jogo.
Mas, aos olhos dos políticos, a cada dois anos esses seres sofrem uma verdadeira metamorfose. Se antes podiam ser comparados a lagartas cinzentas, rugosas e rastejantes, transformam-se em borboletas. Passam a pairar sobre os demais. Atraem pelo colorido das asas, pela delicadeza, pela raridade.
A cada dois anos, quando é época de eleição, as lideranças tornam-se admiráveis, verdadeiros objetos de disputa. São, então, aguardados com cafezinho e água, servidos no melhor copo e na melhor bandeja dos gabinetes. Entre outros agrados que lhes são oferecidos. Nessa época, eles têm passe livre para falar diretamente com os maiorais, não mais com os aspones. Se tiverem que esperar um pouco, pedem- lhes perdão pelo incômodo e pelo tempo perdido.
Mesmo nessa época, claro, uns têm mais valor que outros. Quanto maior o poder de mexer com o coração e a mente das massas, maior a moral. No topo, estão as lideranças religiosas, os presidentes das uniões estudantis, das associações classistas e os líderes comunitários. Não abaixo, vêm os ex: ex-prefeito, ex-vereador, ex-isso, ex-aquilo. Dependendo da conjuntura, tá valendo até ex-suplente (o ex que nunca chegou a ser). No avançar da campanha, até pai de família com mais de quatro filhos, esposa e amante passa a também ser saudado como “liderança”, tira foto abraçado ao candidato e é anunciado como nova adesão – desde que filhos, esposa e amante possuam título de eleitor.
Taxistas, cabeleireiros, manicures e outros trabalhadores que passam o dia a jogar conversa fora com os clientes também tornam-se mais valorizados: são profissionais “em alta” no período eleitoral, dado ao seu poder de persuasão. Só falta reconhecer as lideranças “virtuais”, que se esforçam tanto para que os políticos as vejam tão aguerridas no Twitter e Facebook.
Chegada essa época, as lideranças sabem o valor que têm. Até esnobam um pouco. Dizem que vão conversar com todos os candidatos para ouvir as “propostas” de cada um antes de definir a quem apoiar. Estão certos! O tempo urge e tem que ser bem aproveitado. Quando outubro chegar, cortam-lhe as asinhas e põem-lhes novamente a rastejar.
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