A eleição havida no dia 7 de outubro traz muitas lições. Uma delas, é que parte significativa dos/as eleitores/as foram às urnas depositar votos em candidatos/as que expressam uma filosofia de negação da política. Isso parece um paradoxo, mas é o que se apresenta neste momento. Há tempos já se desenhava na cena política movimentos extremados nos quais era possível perceber que um grande número de eleitores/as estava seduzidos/as pelo uso da força como mediação dos conflitos sociais.
Além desse contingente, também sobressai uma tendência política que tem as suas bases num ideal teocrático, sobretudo entre eleitores/as e candidatos/as que se originam das correntes neopentecostais. Aqui acontece mais uma aglutinação para formar três grupos, porque parte do seguimento de ruralistas encampa sua atividade política no mesmo escopo das forças policias e neopentecostais.
A junção desses três segmentos é o que há de mais importante na formação da sociedade brasileira contemporânea. Isso remonta um pouco da nossa história, desde a colônia até os tempos da primeira república. Naqueles tempos, os senhores de engenhos além de latifundiários (seriam os ruralistas de hoje?) também dominavam a cena política, com a devida benção das lideranças religiosas (católicos de ontem, neopentecostais de hoje?). As forças de segurança da época nem preciso dizer que a serviço de quem estavam.
O conjunto dos votos majoritários é uma mostra de como o Brasil como sociedade é ainda profundamente arraigado com seu passado colonial. Sobretudo porque dentro desses três segmentos, maioria entre votantes no último domingo, a presença de homens, brancos e de classe média é grande. Esse dado revela muito como a pauta conservadora é uma demanda legítima para muitas pessoas no Brasil. Ser conservador/a é uma atitude que nega, veementemente, ideais de emancipação social, por isso mesmo os/as eleitores identificados/as com essa tendência política negam as políticas de vanguarda.
Ser conservador/a é mais importante que preocupações com temas de estado. Por isso, a candidatura mais votada para presidente nem precisaria de plano de governo, nem de ratificação de pressupostos democráticos. Bastava ser uma candidatura conservadora. Para uma grande parte dos/as eleitores/as assumidamente conservadores/as a pauta mais importante é a defesa da família e da religião. Não é à toa que a candidatura preferida tem um slogan que traz “Deus está acima de tudo”.
Outra lição da eleição foi o esfarelamento do Partido da Social Democracia Brasileira que foi avalista da ruptura democrática em 2016. Lideranças desse e de outros partidos que também tomaram o poder na mão grande foram banidas da vida pública, com destaque para Romero Jucá e Eunício de Oliveira.
Estas e outras lições dessa eleição demonstram que há um cansaço de parte das pessoas com os pressupostos democráticos. Parte dessas pessoas realmente se sentem representadas pelo discurso (mesmo que extremo) de defesa de um modelo de sociedade que acreditam ser composto pela ideia da família patriarcal e em Deus. A política conservadora é mais facilmente assimilada pelo conjunto do eleitorado porque simplifica tanto em discurso como em prática dilemas complexos da vida moderna.
Assim, conforta as pessoas com soluções simplistas para problemas de segurança pública, economia, corrupção. A atividade política, para esse movimento conservador, é uma coisa que poderia ser feita, exercida apenas com um rumo único: autoridade. Aqui a autoridade pode ser inclusive a de Deus. Por isso, lemas do conservadorismo são “botar ordem”, “restaurar a moral”, “impor disciplina”. Para esta noção de atividade política, a democracia é a vontade de quem manda e, portanto, pode, porque manda, decidir como as pessoas devem viver, devem amar, devem sonhar.
Adriano Castorino é professor da Universidade Federal do Tocantins, graduado em Letras pela UFG, com mestrado em Ciências do Ambiente pela UFT e doutorado em Ciências Sociais.
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