Aprendendo a ser pai: eu e Marina

Nesse texto quero falar de como uma filha me fez pai, assim é. Nas minhas longas conversas com minha mãe, Marina, que por razões sentimentais também é meu pai, falo sobre minha experiência de ser pai, da Marina. Sou filho de Marina, minha mãe, e agora tive a oportunidade de ser pai da Marina, uma filha memorável. Amo também meu pai, José, mas os caminhos dessa vida separaram-nos, desde 1991. Eu o vejo e sinto em mim a responsabilidade de ser pai, ainda mais se posso exercer minha paternidade com uma pessoa tão envolvente como é a Marina. Conto também com a preciosa ajuda da Kátia, a mãe da Marina, minha companheira, pessoa que em todo o tempo, em todo o tempo, desejou ser mãe. Para ser pai também é preciso aprender com as mães.

 

Nas conversas com a mamãe, falamos de como o nascimento de Marina modificou minha vida. Quando olhei para ela na maternidade, com os olhos pequeninos, os meus olhos já rasos d’água, senti como se meu coração tivesse batendo em outro corpo. Eu era agora um como se dois fosse, eu estava olhando aquela nova pessoa que em minha vida chegava, chegava e já era capaz de suscitar em mim sensações tão indescritíveis.

 

Antes da separação de minha mãe, minha vivência com papai era sempre poética, suave, porque ele sempre fora amoroso, calmo, e de uma sensibilidade incrível. Sua fala sempre calma, em tom baixo, e com gestos delicados, mesmo que calejado pelo trabalho da roça. Gosto de lembrar disso porque mesmo que a relação de meu pai e minha mãe não tenha sido possível, vejo tanto nele quanto nela, que gostam dos filhos. Meu pai, no entanto, depois da separação teve mais problemas.

 

Hoje, quero reforçar em mim o papel de Marina, a filha, na minha formação como pessoa humana. Eu gosto de vivenciar com ela, de aprender com ela, de ouvir como ela fala, como me conta histórias. O som de sua voz atinge meu coração de uma forma assim tão imponderável. Para mim, a oportunidade de ser pai foi uma delícia, porque eu tive a chance de voltar a minha infância, de reviver sonhos, de aprender a ouvir histórias. A Marina me constrói como pai.

 

Com seis anos, nesta data, Marina construiu um canto só dela na minha existência, quando eu recebo um abraço dela é como se todo o vendaval desses dias tão turbulentos, se desmanchassem no ar. Eu sempre que posso, dentre as ocupações da vida, para que ela me conte uma história. Eu gosto que ela me conte histórias, ela as inventa e me conta, eu as escuto cheio dessa atmosfera de faz de conta que fui recuperando, porque a gente na vida adulta fica racional de mais. Como ela diz, os adultos são sérios, as crianças gostam mais de rir.

 

Ela diz: papai, vamos bolar. Papai, vamos fazer um fole. Essas frases são um convite para a gente passear, que significa ficar bolando, dando uma volta, caminhando na praça, no Parque Cesamar, no cinema. Fazer um fole é brincar de jogar travesseiro, de pular no sofá, de lutas. A gente conta muitas anedotas, rimos o tempo todo. A Marina, minha filha, é tão parecida com a Marina, a minha mãe, isso compõe um campo de sentido que me leva direto a minha infância, quando a mamãe fazia várias brincadeiras para a gente se divertir. Meu pai é mais pensativo, menos expansivo. Mamãe é pura algazarra, conta piadas, faz galhofas.

 

Por isso me regozijo tanto, porque sou mais parecido com meu pai, pensativo, com muita facilidade para ficar horas refletindo. Mas a Marina, como uma pessoa de dentro de mim me arranca dessa seriedade da vida adulta, me leva lá para o reino das coisas cheias de cores, de mágicas, de gaitadas, de galhofas, de foles. A minha vida, como pai, é um presente que me mostra como é gostoso a gente se perder num abraço de uma pessoa tão imprescindível como é a Marina na minha vida.

 

Adriano Castorino é técnico em assuntos educacionais, professor, doutorando em ciências sociais/antropologia

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