Dia Mundial da Água – Pouca Água Boa de Beber

No dia 22 de março, o mundo comemora o Dia Mundial da Água. Inexiste o que festejar no Brasil. Sofremos nos últimos anos secas nas principais bacias hidrográficas do país e, no Tocantins, seguimos na mesma quadra. Fomos testemunhas de reduções drásticas dos níveis dos rios que compõem as Bacias do Tocantins e do Araguaia, com sucessivas reportagens, descortinando trágicas travessias de veículos e de pessoas, onde outrora somente animais aquáticos, barcos e canoas dominavam.

 

Queimadas, desmatamentos, voçorocas, assoreamentos, lixões, poluição dos cursos hídricos, captações desordenadas, loteamentos, descasos, enchentes, crimes ambientais constituem inegável “fonte” de pouca água boa de beber.

 

Enquanto isso, sustentabilidade, agroecologia, preservação, recomposição, responsabilização civil por danos ambientais, regularização fundiária, planejamento urbano, reposição florestal, proteção de matas e de nascentes, fauna e flora, princípios da prevenção e precaução, aliados à conscientização ambiental, são falsamente taxados e contaminados como mito ideológico, frente ao poder político e econômico de seletos e privilegiados grupos sociais e políticos.

 

Ainda no período escravocrata nacional, as "Cartas a Favor da Escravidão", de José de Alencar, endereçadas a D. Pedro II, que a editora Hedra publicou após mais de um século de suas transcrições, já traziam em seu texto a economia como fundamento utilitarista e fatalista para manter homens, mulheres e crianças encarceradas sob condições animalescas, para fins de geração de riqueza de poucos aristocratas, apresentando uma narrativa floreada, argumentativa, austera e elegante do sofrimento de muitos, lançando raízes teóricas da posição conservadora pela manutenção da escravidão no Brasil, por período superior a outras nações contemporâneas, que nos sucederam, e muito, enquanto sociedades civilizadas e desenvolvidas.

 

Nos dias de hoje, vemos setores econômicos gestando reiteradas tragédias ambientais, que espalham em nossos cursos hídricos um mar de lama ou lhes retiram até a última gota de água, capaz de manter a vida nos rios, compartilhando da possível subserviência do Estado e suas instituições de controle, em atos dramáticos, como óperas preanunciadas.

 

Porém, existe esperança de que o próximo Dia Mundial da Água não seja uma data de reflexão ou lamento, mas sim de exaltação. Neoprodutores rurais e agentes econômicos lançam férteis sementes da agroecologia, que visam a proteção dos recursos naturais, e setores do Estado começam a adotar postura condizente com o mercado consumidor global e com a comunidade internacional, enxergando na sustentabilidade valor econômico, assim como, na poluição ambiental, atraso e condenação das futuras gerações ao retrocesso.

 

Ao Tocantis, Estado de vastas riquezas naturais, abre-se uma curta e episódica janela para o futuro, na qual a preservação, o ecoturismo, a produção sustentável e a água farta e boa de beber serão os fundamentos de riqueza, de distribuição de renda e de uma vida humana digna que a população tocantinense espera.

 

Francisco J. P. Brandes Júnior – Promotor de Justiça da Regional Ambiental do Araguaia/TO

 

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