Sobral Pinto é uma reserva moral que não cessa de inspirar advogados experientes e os iniciantes. Seu rosto é familiar a qualquer advogado, e seu legado na advocacia é uma aquarela do exercício independente, corajoso, técnico e de elevado denodo. O exemplo deixado por este jurisconsulto de Barbacena, patrimônio jurídico brasileiro, orienta a nossa ética profissional.
Católico, Sobral Pinto tinha o compromisso diário de assistir a Santa Missa, e tinha na sua vida privada hábitos conservadores, prezando pela boa moral. Não são conhecidos excessos que maculassem sua honorabilidade social. Ora, ao olhar de qualquer pessoa, na análise comum e não teórica, poder-se-ia dizer tranquilamente: Sobral Pinto era um homem direito e de direita.
A ímpar conduta pessoal e o exercício do catolicismo não fizeram, tão somente, Sobral Pinto ser este exemplo louvado, e com absoluta justiça, por toda a sociedade jurídica brasileira. Sobral Pinto foi testemunha ocular dos piores momentos que a humanidade passou, e foi incólume no seu exercício profissional, pois a coragem e seu respaldo à ordem legal foram os fios condutores de sua vida como Advogado.
O mundo, no século XX, uniu a maior potência socialista com a sua rival potência capitalista para destruir o nazismo, ideologia que categoriza os seres humanos, algo jamais visto na história: o nazismo é tão repugnante que compará-lo a qualquer outra ideologia é ser condescendente a ele.
Getúlio Vargas, em 1937, a partir de um falso projeto comunista de tomar o poder, chamado “Plano Cohen”, interrompeu a nascitura democracia de 1934, instaurando o Estado Novo, de inspiração fascista. Vargas foi agraciado com uma cópia de “Mein Kampf” autografada pelo próprio Hitler.
Se por um lado, entendia-se que o comunismo era uma ideologia contrária aos valores constitucionais do Brasil, Sobral Pinto entendia que o Estado, no exercício de sua autoridade vertical perante os indivíduos, não poderia torturar, estuprar, violentar e assassinar aqueles que se opunham à ordem legal. Por este entendimento jurídico e correto, Sobral Pinto, conservador e católico, se pôs na defesa de Luís Carlos Prestes e Harry Berger, em 1935, evocando diante da tortura que Prestes e Berger sofreram até o diploma legal da proteção aos animais.
Como certo alemão disse, a história se repete, primeiro como tragédia e a segunda vez como farsa, novamente em torno do combate a um comunismo imaginário, a democracia foi aviltada ao se apear do poder, em 1964, um presidente democrático. Em torno de uma defesa da ordem constitucional, instalou-se um regime que ignorou as normas jurídicas da época: tanto em 1937, como em 1964, as normas jurídicas não autorizavam que os presos pudessem ser seviciados, violentados, torturados, assassinados. Então, os regimes, que a pretexto de combater a ilegalidade do comunismo, foram ilegais em todos os aspectos com seus concidadãos.
Sobral Pinto, novamente, não temeu a violência ignorante da força, e se portou em defesa dos perseguidos pela ditadura cívico-militar de 1964. Inobstante a gravidade da conduta criminosa, Sobral Pinto enxergava a ilegalidade daqueles, que no exercício da função pública, violentassem a lei e os homens. Sua vida católica e suas convicções conservadoras não direcionaram sua prática profissional, pois recusou o foco ideológico, que utiliza da política para a desvirtuação das instituições jurídicas.
Nestes tempos que vivemos, é dever da Advocacia e de toda a sociedade jurídica enxergar com os óculos de Sobral Pinto. As lentes de Sobral são as da impessoalidade, do devido processo legal e da ampla defesa, da prevalência dos direitos humanos independente da pessoa. Enxergar com os óculos de Sobral Pinto é se posicionar, com vigor, contra a sanha autoritária que ataca a advocacia, e cito aqui, como vítimas, o Presidente do Conselho Federal da OAB, Felipe Santa Cruz, e o advogado Cristiano Zanin Martins.
Enxergar com os óculos de Sobral Pinto é ver a Advocacia como a única fronteira sólida entre o Estado e o autoritarismo. A nossa missão exige esta nobreza de caráter, principalmente com aqueles que discordamos, aqueles que repudiamos, mas que não deixam de ser, na melhor acepção do cristianismo, nossos irmãos humanos.
Comentários (0)