O triste fato do assalto seguido de estupro, praticado por um adolescente de 17 anos, contra uma servidora pública, em Palmas, no último dia 1º de junho trouxe à tona, mais uma vez, a problemática social da delinquência juvenil, problema extremamente complexo que se fortalece diante de um aparelho estatal ineficiente para enfrentá-lo. O que me deixou estarrecido, no caso específico desse menor, foi a flagrante incompetência do poder público através das forças de segurança. Digo isso porque o infrator é tido pela polícia como de alta periculosidade, possuindo vasta ficha criminal, que envolve, além de roubos e tráfico de drogas, cerca de dez homicídios, praticados nos Estados do Pará e Paraná, conforme o próprio menor confessou à PM. Isso aduz que o agente tocou o terror, destruiu vidas e famílias, vindo a ser preso somente agora aqui no Tocantins.
Em Palmas, após abordar a servidora pública na Praça do Girassóis em plena luz do dia, o criminoso obrigou a vítima a conduzir o próprio veículo até a região de Taquari. Ou seja, atravessou praticamente toda a cidade, dotada de moderno sistema de monitoramento por câmeras (de segurança?). Então essas câmeras são capazes de perscrutar o interior de um veículo e fotografar uma criança fora da cadeirinha ou sem o cinto de segurança, mas não identificam um assaltante que faz todo esse percurso com uma refém sob a mira de uma arma de fogo? Falha imperdoável!
Pela ficha criminal, fica depreendido que o suspeito vinha praticando crime há muito tempo. Os órgãos de segurança (o Estado em sentido amplo) não conseguiu freá-lo por quê? E se esse menor tivesse sido acompanhado desde a transição da infância para a adolescência, será que teria se tornado um delinquente?
O trabalho de combate à violência e delinquência juvenil parece não funcionar no Brasil. E talvez isso não esteja relacionado com a legislação da menor de idade, especificamente, e sim, com a inércia do poder público de atuar nessas questões, cumprindo o que determina a lei.
O sucateamento das instalações socioeducativas existentes, aliado à falta de vagas nos centros de ressocialização e o número insuficiente de pessoal qualificado para trabalhar com os menores infratores, servem como potencializadores das mentes criminosas.
É inconcebível acreditar na possibilidade de se formar cidadãos (a quem muitas vezes foi negado o acesso a bens e garantias fundamentais, como moradia, saúde e educação) em um ambiente inóspito, que atenta contra os princípios mais rudimentares de dignidade da pessoa humana.
O desafio se agiganta quando paramos para analisar o perfil do menor infrator no Brasil. De acordo com dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), divulgados em junho de 2015, o menor infrator é negro, do sexo masculino, tem de 16 a 18 anos, não frequenta escola e vive em situação de miséria. Ou seja, o Estado brasileiro vem fracassando em sua missão constitucional de promover a ordem e o bem estar social. E essa negligência recorrente produz um preço cada vez mais caro à sociedade e ao próprio Estado: de um lado o poder público gasta (mal) cada vez mais recursos com o falido sistema carcerário brasileiro e, do outro, a população vive cada vez mais atônita pela sensação de insegurança e medo.
Diante de uma realidade pervertida e sem solução aparente, conforme referido, é normal o cidadão querer respostas imediatas, como penas mais gravosas ou revisão do legislação da menor idade. É até admissível que esse debate seja feito, contudo, o problema da segurança pública no Brasil, no Tocantins consequentemente, não pode ser analisado de forma simplista, de maneira a reduzir os fenômenos complexos da questão a seus componentes mais simples; pois, desse modo, estaremos a insistir em paliativos que lidam com os efeitos da problemática, sem, contudo, tratar a sua causa.
Faço estas ponderações não como que querendo ter a fórmula da solução, mas tão somente para dizer que a problemática é por demais complexa e deve ser tratada conforme requer. E, sem dúvida, o começo de tudo é o Estado cumprir a sua obrigação de tutelar os direitos e as liberdades de seus representados. E isso não se faz com um amontoado de leis, mas com investimentos sérios, sólidos e continuados na prevenção, combate e repressão da criminalidade. Esses investimentos deveriam começar com melhores condições, estruturas e equipamentos de trabalho dos agentes de segurança e continuar com infraestruturas adequadas para receber e manter os infratores internados por tempo suficiente para a sua ressocialização e devolução para o meio social.
Diante do caos há quem defenda que a solução mais adequada (ou mais fácil?) seria prisão duradoura ou até pena capital para os infratores; muitos já não acreditam mais na redenção do ser humano que se tornou um ser antissocial. Mas alguém com propriedade já defendeu que “O homem não nasce nem bom nem mau”, sendo, doutro modo, produto do meio. A vivência social forma o caráter do indivíduo, e uma das características mais marcantes da raça humana é a sua capacidade de adaptação e aprendizagem. Razão porque o Estado não pode fugir ao seu dever legal, sob pena de fracassar na razão maior de sua existência, que é ser o ente promotor da paz e do bem estar social. O fracasso nessa missão seria um retorno ao retrocesso da barbárie e a suplantação do sonho de um país civilizado e digno, porque tanto lutamos até aqui.
Antonio Bandeira é estudante de direito e cabeleireiro empreendedor em Palmas.
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