Política e politicagem

Veja o que o pedagogo Luciano Coelho fala sobre o verdadeiro sentido da política e da politicagem.

A cada eleição no Estado democrático de direito que vivemos, o eleitor tem a oportunidade de escolher o seu representante, seja do executivo ou legislativo. É oportunizado também aos candidatos espaços na mídia e reuniões públicas, tendo como objetivo apresentar suas propostas, ter contato direto com o eleitor, conquistar a sua simpatia. Um período muito fértil de ideias, projetos com cifras exorbitantes que o eleitor acaba mantendo acesa a chama da esperança, principalmente aqueles com menor poder econômico.

 

Existe algo mais motivador do que sonhar? Sonhar em ver as promessas que te levaram a eleger seu representante sendo concretizadas. Ver o transporte público funcionando com eficiência, o sistema de saúde pública atendendo as demandas da população, uma educação que realmente nos ensine e prepare nossos filhos para o amanhã, as ruas bem pavimentadas, bairros e quadras bem equipados com aparelhamento público, segurança. Sonhar com oportunidade de emprego, turismo, esporte e lazer para nossas famílias. Enfim, uma cidade vivendo em harmonia com a sociedade e seus representantes. Um sonho!

 

Salazar, presidente de Portugal, em um de seus discursos (1928) disse: (...) “represento uma política de verdade e de sinceridade, contraposta a uma política de mentira e de segredo. Advoguei sempre que fizesse a política da verdade, dizendo-se claramente ao povo a situação do País, para habituá-lo à ideia dos sacrifícios que havia um dia de ser feitos, e tanto mais pesados quanto mais tardios. Advoguei sempre a política do simples bom senso contra a dos grandiosos planos, que tão grandiosos é tão vastos que toda a energia se gastava em admirá-los, faltando-nos as forças para a sua execução. Advoguei sempre uma política de administração, tão clara e tão simples como pode fazer qualquer dona de casa – política comezinha e modesta que consiste em se gastar bem o que se possui e não despender mais do que os próprios recursos”.

 

Coincidências a parte! Mesmo sabendo quem foi Salazar em Portugal, suas contradições políticas, o regime implantado, mas algumas verdades podem ser extraídas de seu discurso, mas será que fazer política é ser contraditório entre o discurso e a prática? No século XVI, Pascal (1923 – 1662) nos alertou: “Não há pior forma de maldade do que aquela feita com gestos de bondade”. No Brasil, bem como no Tocantins, políticos antigos ou os novos insistem em seguir esta premissa, como se fosse um ritual bíblico do político.

 

Prometer e não cumprir, projetar e não executar, e quando executa o faz de forma desleal (roubando), receber apoio político nas eleições e após a posse no mandato deixar os companheiros de primeira hora na chapada. Os escolhidos para fazer parte do mandato como colaborador também sofrem: Alguns com poder demasiadamente maior do que podem suportar, outros sem poder nenhum, uma simples marionete nas mãos do mandatário. E por fim, alianças com adversários de forma mal explicada para a sociedade. Entra ano e sai ano, as histórias são contadas, ouvidas pelos cantos das cidades. Um rico enredo para crônicas, peças teatrais, filmes, músicas, livros.

 

Albert Einstein também me fez refletir. Em ‘Como Vejo o Mundo’ ele faz um relato interessante sobre: “A falsa sabedoria política, é reduzido o numero daqueles que veem com os seus próprios olhos e sentem com o próprio coração. Mas da sua força dependerá que os homens tendam ou não a cair no estado amorfo para onde parece caminhar hoje a multidão cega. Quem dera que os povos vissem a tempo, quanto terão de sacrificar da sua liberdade para escapar à luta de todos contra todos! Existe, assim, uma espécie de compromisso, criminoso para a humanidade, embora o considerem como sabedoria política. Não podemos desesperar dos homens, pois nós próprios somos homens”.

 

Mesmo sendo o texto acima escrito para um período passado de nossa historia, ele se encaixa perfeitamente nos dias atuais, como a mais pura verdade. Pactos políticos de gabinetes, descarados, em nome da governabilidade. Quem foi eleito para governar não governa, quem foi eleito para legislar e fiscalizar, não o faz, tudo em nome da governabilidade!

 

Somos sacrificados dia após dia, ao morrer milhares de pessoas nas estradas mal cuidadas, estamos morrendo em hospitais mal estruturados e pouco humanizados, onde deveriam nos salvar. Morremos por bandidos nas ruas ou até mesmo dentro de nossos próprios lares. Somos hoje prisioneiros do medo. Morremos em tragédias naturais ou não, se o dinheiro público estivesse sendo aplicado como deveria, ou o Estado cumprindo seu papel também de fiscalizador. Mas até quando vamos suportar isso?

 

O nosso saudoso Chico Anysio em entrevista disse: “No Brasil de hoje tem medo do futuro e os políticos tem medo do passado”! Será que tem mesmo? Concordo em parte, o cidadão tem medo do seu futuro porque a incerteza é uma coisa inerente da própria vida, mas no seu raciocínio ele queria nos dizer que não temos segurança do amanhã com tanta roubalheira, insegurança e falta de conduta ética e moral de nossos representantes.  A impunidade reina!

 

Espero um dia poder escrever novamente sobre este tema contrapondo o que escrevi hoje, indo para um viés que algo novo aconteceu de fato, que a mudança existiu, não foi somente sonho. Que o político cumpra o seu dever de representar bem a sociedade, que o poder legislativo cumpra seu papel de legislar e fiscalizar, que o poder judiciário faça justiça. Que a arte, o dom de fazer e viver política estejam sempre sobrepondo à arte matreira e perniciosa da politicagem!

 

 

 

*Luciano Coelho de Oliveira – Pedagogo/Orientador Educacional  - Especialista em Docência do Ensino Superior – Planejamento e Gestão em Serviço Social, Atualmente trabalha no Centro de EJA Jandira Torres da rede municipal de ensino em Palmas - Tocantins.

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