Sessenta socos. Menos de um minuto de agressão no rosto. Essa foi a cronologia chocante da violência contra o corpo de uma mulher — mais uma entre tantas de nós que somos agredidas todos os dias e mortas a cada quatro horas. Teve-se conhecimento no mesmo dia em que foi divulgado o número de 1.450 feminicídios em 2024, a pesquisa "Visível e Invisível: A Vitimização de Mulheres no Brasil", do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), revelou que mais de 21 milhões de brasileiras com 16 anos ou mais relataram ter sofrido algum tipo de violência nos últimos 12 meses.
É preciso endurecer os mecanismos de monitoramento e punição. É certo que os dispositivos existentes representam um avanço. No entanto, mesmo com um aumento de mais de 225% no número de casos recebidos pela Justiça desde 2020, esses dados ainda são insuficientes diante da desvalorização do problema pelo senso comum. E isso nos remete, mais uma vez, à urgência de um discurso claro: ou reinventamos a educação de meninos e meninas, ou não mudaremos essa realidade.
Afirmo em um poema que “o medo da mulher é perecível”, numa releitura de Adélia Prado, que diz: “mulher é desdobrável”, expressando a complexidade e a natureza multifacetada da mulher — sua capacidade de se adaptar e se desdobrar em diferentes papéis e situações. O feminismo, até hoje, tem sido a única corrente de pensamento capaz de oferecer respostas e alternativas, ao impulsionar a criação de políticas públicas para enfrentar a guerra contra as mulheres.
Um dado dentro desse arcabouço estatístico precisa ser urgentemente observado e combatido: o recorte racial. Das situações expressas, 63,8% das mulheres assassinadas eram negras. A resposta não está apenas na oferta de cotas em instâncias de participação social, mas sobretudo em um olhar justo sobre a educação e o currículo ofertado desde o ensino fundamental até o universitário.
Como afirma a linguista Júlia Kristeva: “O feminismo é, antes de tudo, um humanismo.” Um indivíduo consciente dessa condição, e sob a influência de um sistema de justiça ágil e eficiente, teria pouca chance — ou nenhuma — de desferir sessenta socos no rosto de uma mulher.
Juliete Oliveira
Cajazeiras-PB, 29 de julho de 2025
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