No último dia 13 de junho rememoramos os cinco anos da histórica decisão do Supremo Tribunal Federal - STF no Mandado de Injunção nº 4733 equiparando ofensas homotransfóbicas ao crime de racismo (Lei n.º 7.716/1989). Vitória junto ao Poder Judiciário capitaneada pelo Dr. Paulo Iotti, advogado da causa, sustentado por anos de resistência e luta do povo LGBTI+ periférico antes dele.
Toda evolução e garantia para a nossa comunidade deve ser comemorada, festeja até, visto que não há ninguém por nós. Não há a construção histórica de reivindicação de dignidade e respeito, por qualquer líder que seja, em nosso nome em toda a história desse país. A criminalização da LGBTfobia fora o auge da esperança. Dotados de uma coragem diferente e revolucionária, em pleno governo ultradireitista. Era como se tivéssemos mesmo ganhado aquela rinha de galo e galinha. Eu, que na ocasião da sessão do Supremo, estava no púlpito do auditório da OAB Tocantins falando sobre a necessidade do amor permear todas as relações, me emocionei quando fui avisado da criminalização. Ousei dizer: adentrarmos para história como uma comunidade que exigirá o seu respeito!
Imaginava que o governo, estadual, já que o federal que ignora oferta de vacina, jamais acataria uma decisão judicial, se debruçaria na formulação de política pública, de incentivo a promoção a nossa comunidade, que, ao menos, publicaria protocolos para reunião de dados públicos confiáveis que pudessem embasar decisões governamentais mais corretas e direcionadas ao nosso bem-estar e melhor vivência em solo tocantinense.
Aguardava que a nossa comunidade, por intermédio da militância, se reuniria para garantir a eficácia da decisão. Que iríamos sair em verdadeiras caravanas aos quatro cantos com o intento de compartilhar os saberes para exigir que nosso povo, constitucionalmente, fosse protegido e tutelado pelas forças policiais, pelos nossos representantes públicos. Que tínhamos findado a época do pires na mão, da súplica. Que tínhamos inaugurado a era da exigência, da completude.
Cinco anos depois e a realidade se apresenta a mesma que antes da decisão. E não! Não é uma visão negativa. Vamos aos fatos. O Tocantins não possui um plano, uma política pública, clara e concreta que vise a melhoria e promoção da vida da população LGBTI+. Não existe protocolo de atendimento de saúde para a população trans, sendo tal assunto ainda tratado como caridade ou algo a ser resolvido a contas gotas. Apesar de existir a Diretoria de Diversidade (não sexual) e Inclusão Social pouco se extrai de efetivo dos trabalhos lá desenvolvidos há quase um ano. Não há centro de referência. Não há, nem tão pouco, delegacia especializada e protocolo de processamento de dados dos crimes de ódio, números importantíssimos para a futura formulação de programas públicos de proteção. Não há catalogação da violência contra nossa sigla na cidade ou no Estado.
O que há é vereador do interior usando tribuna para ofender homem gay. O que há é um pastor golpista bloqueador de ponte ofendendo a comunidade diante de um banner que festeja o amor. O que há é candidato inexpressivo a vereador que não tem a noção do qual seja o símbolo das pessoas do espectro autista, confundido com a bandeira da diversidade, e nos achincalhando nas redes sociais. O que nós temos é observar o Estado do Tocantins sendo o único estado que ofertou dois votos a favor da proibição do casamento homoafetivo junto a Comissão da Família da Câmara dos Deputados. O que se tem é ser tocantinense o projeto de lei que pretende culpabilizar a vítima de estupro a pena maior que a do estuprador em caso de aborto legal. Palmas. Araguaina. Gurupi. Tocantins não evoluiu nenhum milímetro na busca pela efetiva dignidade e criminalização dos crimes de preconceito LGBTfobicos!
Parcela imensa de culpa é nossa! É da militância. Que diante dos projetos pessoais e individuais, apesar da maquiagem de coletivos, dispensaram pelo caminho os brios e se alinharam, conversaram, sentaram e acertaram pontos convergentes, se é que existem, justamente com nossos algozes. Que se preocupa com a festa, com o lacre, e não se apega ao advocacy, a conscientização e maximização dos públicos. Ao furar a bolha. Ao conscientizar as periferias. Ao organizar as travas, as manas, as monas e as sapatão! Estáticos no tempo, assim como São Paulo já se vislumbrou, mesmo com centenas de anos de diferença, salvos graças aos novos nomes da política paulistana como Carol Iara, a militância tocantinense não possui mais a desenvoltura de parar de olhar para o próprio umbigo.
Que os anos assombrosos que se anunciam, com a possibilidade de novo levante da ultradireita ao poder, inclusive em escala municipal. Com a perspectiva da direita, no próximo pleito nacional, fazer maioria tanto na Câmara quanto no Senado, abrindo precedente para impeachment de Ministro do Supremo Tribunal Federal, o que conduziria certamente a uma Suprema Corte reformista das suas próprias ideias e decisões dirigidos a um conservadorismo falso moralista. Ou seja, os direitos que tanto celebramos podem sim deixar de existir. Que tudo desperte os olhares para o que realmente importa! Reivindicar direitos coletivos pela formação de um povo consciente, solidário e revolucionário! Para que possamos, enfim, viver e amar no Estado que tanto amamos! Para que se possa verdadeiramente brandar: VIVA! A DIVERSIDADE!
*Landri Neto, advogado, presidente do conselho de defesa dos direitos humanos e presidente da comissão de diversidade sexual e de gênero da OAB Tocantins e IBDFAM Tocantins
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