Anestesista faz greve de fome em Araguaína em protesto por pagamentos atrasados

O médico anestesista Roberto Corrêa iniciou um protesto em frente ao Hospital Regional de Araguaína. Ele faz greve de fome para cobrar do governo dívida de 12 milhões com a categoria

Médico Roberto Corrêa Ribeiro
Descrição: Médico Roberto Corrêa Ribeiro Crédito: Foto: Divulgação

O médico anestesista Roberto Corrêa Ribeiro de Oliveira, iniciou às 7 horas da manhã desta quarta-feira, 31, em frente ao Hospital Regional de Araguaína, uma greve de fome em protesto por causa de uma dívida no valor de R$ 12 milhões que o Governo do Estado tem com a Cooperativa dos Médicos Anestesiologistas do Tocantins (Coopanest) há um ano.

 

Em entrevista, por telefone ao Portal T1 Notícias, nesta tarde, Roberto disse que ficará sem comer até o dia em que seu corpo suportar, durante dia e noite. “Não estou fazendo greve de fome para impressionar, mas mostrar a sociedade o problema que estamos enfrentando. Não trabalhamos com carteira assinada, não temos salários fixos, recebemos por produtividade, por procedimento cirúrgico e o Governo ainda fica um ano sem nos pagar. Os anestesistas do interior do estado estão passando fome. Nós estamos pegando empréstimo em banco, tendo que negociar pra vivermos, pagar nossas contas, sustentar nossas famílias”, desabafou o médico.

 

O anestesista disse ainda que outro motivo que o levou a fazer a greve de fome foi o fato do secretário da Saúde do Estado do Tocantins, Marcos Esner Musafir informar à imprensa que os médicos anestesistas estavam agravando casos clínicos de alguns pacientes por estarem em greve. “Nós nunca fizemos greve, sempre atendemos urgências e emergências, o que nós deixamos de atender foram cirurgias eletivas. Essa atitude é uma tentativa de jogar a população contra a gente”, disse Roberto.

 

O médico elaborou um documento relatando a situação da categoria e encaminhou para o secretário. Confira a íntegra:

 

Em resposta à Notificação nº 20/2016, encaminha à COOPANEST-TO – Cooperativa dos Médicos Anestesiologistas do Tocantins, Processo nº 2011.30550.001777, assinada pelo excelentíssimo senhor Marcos Esner Musafir, secretário de Saúde do Estado do Tocantins, acusando-nos de estarmos agindo de forma irresponsável para com os pacientes internados no Hospital Geral de Palmas – HGP, gostaria de salientar que:

Após ler a notificação supra citada, no intuito de facilitar a compreensão, por parte dos cidadãos tocantinenses, das reais dificuldades por que passam atualmente os anestesiologistas desta cooperativa, tomo a liberdade de fazer algumas considerações, que acredito serem fundamentais  na elucidação de algumas questões importantes deste conflito.

Didaticamente, podemos dividir a história da Coopanest/TO, em 2 fases completamente distintas :

A) Uma fase inicial harmônica, onde, no passado, o respeito e a confiança eram as atitudes que norteavam o relacionamento mútuo entre o estado e esta cooperativa ( Antes do senhor Musafir );

B) Uma fase atual desarmônica, onde o desrespeito, a desconfiança e o autoritarismo são as marcas registradas da política imposta pelo governo, no relacionamento para com a Coopanesta. ( Pós Musafir ).

Para facilitar a compreensão, 2 perguntas simples precisam ser respondidas:

1º - Qual é o regime de trabalho à que estão submetidos todos os anestesistas do estado do Tocantins?

2º - Como são remunerados?

Trabalhamos sob o regime de cooperativa, não possuindo nenhum vínculo empregatício com o estado, além disso, não usufruímos de nenhuma proteção legal existente nas leis contidas na CLT, como salário fixo, férias, 13º salário, direito a atestado médico, licença maternidade/paternidade, FGTS, seguro desemprego, seguro saúde, aposentadoria, etc.

No que concerne à nossa remuneração, recebemos apenas o que produzimos.

Se fizermos um plantão de 24 horas, em um final de semana, e nenhuma anestesia for realizada, nada receberemos.

Será que a comunidade tocantinense tem conhecimento de que não recebemos nenhum salário mensal, ou qualquer valor fixo por cada plantão realizado?

Você aceitaria trabalhar nestas condições ?

Outro detalhe importante à ser considerado, é que há quase 30 anos esta cooperativa vem oferecendo um serviço de altíssima qualidade  à comunidade tocantinense, disponibilizando especialistas anestesistas, formados nas melhores universidades do país, para os principais hospitais  de quase todas as cidades do interior do estado, resolvendo assim, um antigo  problema de falta de profissionais qualificados para as pequenas cidades do interior do estado.

É oferecido pela Coopanest - TO, uma assistência médica de 24h por dia, 7 dias por semana, 30 dias por mês, 365 dias por ano, à todos os hospitais que possuem a nossa cobertura profissional de trabalho.

A Coopanest, conseguiu desta forma, implantar no estado do Tocantins, a tão propalada e sonhada interiorização do médico brasileiro.

Profissionais bem preparados e muito capacitados, ofertam um serviço público de qualidade para essas cidades menores, fixando estes doentes em suas comunidades, o que acabou por desafogar os serviços públicos de saúde da capital e de alguns centros maiores, como Araguaína, Gurupi, Porto Nacional, etc.

Em um passado não muito distante, o convívio harmônico e respeitoso entre a Coopanest e o governo do estado, sempre foi uma marca importante no relacionamento destas duas entidades, o que possibilitava um espírito de confiança e de colaboração mútua entre as partes envolvidas.

O estado, compreendendo a real importância que a permanência destes anestesistas nestas pequenas cidades significava para o perfeito funcionamento do SUS como um todo, procurava estimular a fixação destes profissionais  nestas comunidades, não deixando que os mesmos perdessem o estímulo e continuassem a exercer com eficiência e dignidade o seu trabalho.

Em contra partida, a Coopanest, sempre foi solidária e compreensiva para com o estado em seus momentos de maiores dificuldades  econômica-financeira, mantendo o fornecimento de um serviço de qualidade, independentemente do pagamento de nossos honorários.

Sempre tivemos uma relação de carinho e de respeito para com o amado povo tocantinense que com tanto carinho nos acolheu.

Como pode o atual secretário da saúde, Marcos Esner Musafir, tentar jogar a população deste estado contra a nossa cooperativa?

Seria uma ato ingênuo de um forasteiro que desconhece a verdadeira história de construção deste estado, ou um ato de má fé e de maldade?  

Uma gestão honesta, competente e de qualidade na área da saúde, criava uma ambiente salutar, onde o respeito e a confiança entre todos os colaboradores, alicerçavam a base para a construção de uma saúde pública de qualidade para o sofrido povo tocantinense.

Infelizmente, o sonho acabou.

Gradativamente as coisas foram piorando e os mais diversos tipos de problemas e de dificuldades começaram a aparecer na atual administração.

Muitos seriam os pontos que poderia abordar, já que vivi os meus 17 últimos anos de vida, dentro ”das entranhas deste monstro”, que hoje devora de forma lenta e cruel, o cidadão mais humilde e necessitado; mas procurarei me focar nas calúnias e nas inverdades que foram levantadas contra os anestesistas deste estado.

Sei que provavelmente sofrerei retaliações e perseguições por parte do governo e do atual secretário, mas não deixarei que estas ameaças me impeçam de relatar a verdade.

Aproveito esta oportunidade para deixar claro que este relato é de caráter individual e não representa a opinião da diretoria da Coopanest– TO e muito menos de outros cooperados.

Gostaria de denunciar a comunidade tocantinense, aos valorosos membros do ministério público, da promotoria, e do judiciário de uma forma geral, a grave situação por que vem passando os anestesistas que prestam serviço ao estado.

O atual secretário vem paulatinamente massacrando a nossa categoria. Estamos com 12 meses de salários atrasados, a maioria dos anestesistas do estado estão passando por enormes dificuldades financeiras, alguns relatam que estão passando até fome e que não tem dinheiro nem para deixar o estado.

Muitos estão endividados e já se desfizeram de patrimônio, e estando endividados em instituições financeiras, encontram -se impedidos de pegar mais crédito. É uma grande covardia o que estão fazendo com a nossa especialidade.

Você continuaria a trabalhar normalmente em seu emprego se ficassem 12 meses sem lhe pagar o seu salário?

É um grande absurdo o que estão fazendo com a saúde deste estado.

Quais são as reais intenções do atual secretário de saúde, do excelentíssimo governador Marcelo Miranda?

Deixar-nos de joelhos para aceitarmos qualquer migalha que nos ofereça na próxima renegociação contratual, à realizar-se em novembro próximo?

Ou seria tirar todos os anestesistas que deram anos e anos de seu sangue e de suor na construção deste estado, para ocupar as nossas vagas com o seu pessoal bronzeado do Rio de Janeiro?

Muitas são as perguntas, várias poderiam ser as respostas. Infelizmente não as tenho.

A única certeza que possuo, é que os atuais futuros candidatos a prefeito destas pequenas cidades do estado do Tocantins, precisam abrir os seus olhos, pois estão correndo um grande risco, de em um futuro bem próximo, ficarem sem seus profissionais anestesistas que estão migrando para outros estados ou retornando para os seus estados de origem, frente a grande dificuldade de manterem as suas famílias neste estado.

Hoje, o Brasil passa por um grande momento histórico.

Estamos conseguindo retirar do poder, após 13 anos de governo, um partido que possui como filosofia a opressão, a dissimulação e a mentira. Daqui há poucas horas nos libertaremos.

Não há mais espaço para este tipo de atitude em nosso país. Não podemos nos calar.

Precisamos combater essas ações em nível municipal, estadual ou federal.

Precisamos nos unir e lutar contra qualquer tipo de opressão e tirania, venha de onde vier.

A classe médica foi uma das mais atacada e humilhada por esse governo corrupto que hoje deixará o poder. A estratégia de jogar a população contra os médicos brasileiros é uma estratégia covarde e que não pode ser de forma nenhuma aceita pelos atuais profissionais que conseguiram sobreviver a este massacre cruel.

Jogar a população tocantinense e o ministério público contra os profissionais anestesistas da Coopanest – TO, é um ato covarde e perigoso, que usa de argumentos falsos e ardilosos,  para tentar comprometer e manchar a nossa reputação e a nossa imagem frente a opinião pública e ao judiciário.

Somos motivos de chacotas dentro dos hospitais, nas ruas, universidades e redes sociais quando sabem que estamos há 12 meses com os salários atrasados, e mesmo endividados, continuamos cumprindo religiosamente as nossas escalas de trabalho dentro dos hospitais tocantinenses, acordando cedo e saindo tarde dos centros cirúrgicos.

Mal sabem os que riem pelas nossas costas, que continuamos exercendo as nossas atividade por respeito aos doentes e ao povo tocantinense que necessita de nosso serviço e não pode ser punido por atitudes irresponsáveis e inconsequentes de gestores que não possuem compromisso com os eleitores que confiaram os seus votos à eles.

Se interrompemos a realização de cirurgias eletivas (as que não são de urgência e que não colocam a vida dos pacientes em risco, como por exemplo uma fimose, plástica de mama, hérnia umbilical não complicada) é porque foi o único instrumento de pressão que nos restou, antes que se acabe o arroz e o feijão que alimenta os nossos filhos, ou que sejamos obrigados a nos desfazer de nossas casas para pagarmos as nossas dívidas junto as instituições financeiras.

Não, senhor secretário Marcos Esner Musafir, não será desta forma que a ”banda tocará”. Pelo menos me dê o direito de escolher a música que eu quero dançar.

Vossa excelência tenta matar-nos de forma sorrateira e silenciosa, roubando-nos a nossa dignidade e o nosso amor próprio. O tempo da escravidão acabou.

Não me submeterei aos seus caprichos e à sua tirania.

Sou um incansável combatente do Programa Mais Médicos que utiliza o trabalho escravo de pobres e submissos médicos cubanos para realizar trabalho médico em território brasileiro em pleno século XXI, como poderia me submeter aos seus caprichos e a sua tirania?

Se quer que eu trabalhe, pague o que me deve. Quero os meus 12 meses de salário que vossa excelência insiste em reter. São horas e horas de trabalho suado, de dedicação e de amor aos meus pacientes.

Você não tem o direito de se apoderar do fruto de meu trabalho.

Quem dirá estalar o seu chicote nas minhas costas exigindo que eu trabalhe sem receber por isso.

Nunca em minha vida profissional deixei de anestesiar um paciente porque o mesmo não possuía dinheiro para me pagar. Mesmo nos raros momentos que efetuamos a nossa paralisação, muitas vezes anestesiei, para cirurgias não emergenciais, por pena do paciente.

Não admito que tente jogar a população contra os anestesistas deste estado.

Para finalizar, informo a vossa excelência, que como ato de protesto, ficarei em frente ao Hospital Regional de Araguaina, em greve de fome, até receber o dinheiro que me (nos) é deve.

Peço desculpas a minha esposa Maria Cristina Stefenoni Ribeiro, as minhas filhas Ana Carolina Stefenoni Ribeiro e Mariana Stefenoni Ribeiro, a minha mãe Selma Corrêa Vasconcelos, aos meus colegas de trabalho e anestesistas da Coopanest – TO, aos meus amigos e alunos de medicina da Universidade ITPAC, pela exposição que este ato venha à lhes causar.

Há anos atrás, o ex-governador Siqueira Campos fez greve de fome para que fosse criado esse belo estado, é muito triste saber, que após alguns anos de criação, terei que fazer a mesma coisa apenas para receber o meu salário. À que ponto chegamos.

Araguaína,31 de agosto de 2016

Dr. Roberto Corrêa Ribeiro de Oliveira

Médico Anestesiologista – COOPANEST TO – CRM 1083

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