1ª médica indígena da UFT se inscreverá no Mais Médicos: "Vou ajudar meu povo"

Formada na primeira turma de medicina da Federal do Tocantins, Wilses Tapajós conta que tem uma responsabilidade com o povo indígena; Ela defende as cotas e cobra estrutura para trabalho médico

Wilses Tapajós
Descrição: Wilses Tapajós Crédito: Arquivo pessoal

“Eu entrei por cotas. Eu tenho uma responsabilidade com o meu povo. Não sou obrigada a ir, mas é a minha origem e não é nenhuma dificuldade para mim. Eu vou trabalhar pelos indígenas”. Essas foram as palavras de Wilses Tapajós, primeira médica indígena formada pela Universidade Federal do Tocantins (UFT), em entrevista ao T1 Notícias.

A indígena que se formou em 1995 em enfermagem pela Universidade Estadual do Pará (Uepa), e passou a ser concursada como enfermeira no Tocantins em 1998, fala que um dos seus projetos prioritários, agora como médica, é ajudar, como ela repete incansavelmente, “o meu povo”.  

“Para iniciar o meu trabalho já deixei curriculum pelo interior. Gostaria de trabalhar em Nova Rosalândia, cidade que deu muito apoio na minha formação. Miracema e Tocantínia são duas cidades que também estão nos meus planos. E para que isso ocorra eu vou me inscrever no Mais Médicos”, conta.

Alegre, Wilses conta que já recebeu o seu CRM e que tentou se inscrever no programa do Governo Federal em agosto, mas não conseguiu. “Na próxima vez que abrir eu me inscrevo”, ressalta animada. Sobre a discussão da vinda de profissionais da saúde de outros países, a médica indígena é incisiva. “Se fosse só alguém para diagnosticar, meus pajés resolveriam. Além de médicos a gente precisa de estrutura”, completa.

Cotas

A filha de Wilses, Winny Tapajós ingressou na UFT neste ano, no curso de Arquitetura e Urbanismo, também pelo sistemas de cotas. A mãe, que no início do curso de medicina dizia não saber se posicionar sobre o assunto, declara que se sente mais madura para defender o sistema de seleção cotista.

“Eu tenho vários colegas (indígenas) que lutam para entrar, mas às vezes nem mesmo pelas cotas alguns conseguem. Acredito que quando houver investimentos em educação básica para o negro, o índio e o pobre, e a partir do momento em que eles tiverem oportunidades aí sim as cotas poderão acabar”, opina.

Ela ressalta também que além das cotas é necessário que haja dentro da universidade mais programas que auxiliem o indígena a permanecer na faculdade. “Tem que existir um maior trabalho contra a evasão. O meio universitário é muito diferente do meio indígena e também existem as questões financeiras. Caso haja apoio, grandes e bons profissionais serão formados”, diz.

Sobre a possibilidade de ter sofrido preconceito por ser cotista, Wilses conta que os estereótipos foram caindo com a convivência e com o passar dos anos. “No início eu percebia algum desconforto, mas depois meus colegas foram me conhecendo e eu conhecendo eles. Houve troca de experiências e agradeço muito pela ajuda que tive deles. Acho até mesmo que hoje eles pensam de forma diferente sobre o sistema de cotas”, explica.

História

Wilses Tapajós é casada com o enfermeiro Severino Louzada Giácome e faz questão de dizer a reportagem que “sem ele eu não conseguiria”. A indígena possui ainda três filhas, uma de 6 anos, uma de 9 e a mais velha com 17 anos. “Assim que eu entrei na UFT, minha caçula era recém-nascida. Eu a levava para a universidade para amamenta-la e depois forrava o chão da sala de aula e a colocava para dormir. Hoje todos lembram”, conta.  A médica relata ainda que trabalhava a noite fazendo plantões para poder auxiliar nos gastos de casa, e ressalta orgulhosa “não reprovei em nenhuma matéria”.

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