A terra nossa de cada dia

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Hoje passei boa parte da tarde de prosa com um antigo conhecido que optou pela vida de sem terra. Ele é um dos 800 integrantes do assentamento Sebastião Bezerra, uma invasão de terras entre Palmas e Porto Nacional.

Fiquei interessadíssima e tentei tirar todas as minhas dúvidas sobre o tal “ projeto”, como ele intitula a invasão.

Sebastião Bezerra foi um líder sem terra. È importantíssimo manter viva a lembrança de grandes “guerreiros”, forma de tratamento dada ao homenageado.

Os líderes dessa invasão são “Hélio Maluco” e “Zefa doida”. Segundo minha fonte, são casados a poucos anos e há mais de 20 anos atuam como líderes desse tipo de movimento. O primeiro fazia parte do MST e ela do MBA. Quando os movimentos se uniram o casal se uniu também. Foram retratados como pessoas educadíssimas, mas fortes na hora de tomar decisões...” Já vi o Hélio Maluco chamar três integrantes para derrubar um barraco...ele chamou o cabra, explicou os motivos pelos quais ele estava saindo do projeto, e em menos de 5 minutos o barraco tava derrubado e a madeira dividida entre aqueles que precisavam dela...”

As regras ali são bem definidas. “Cachaça” não entra, cada um tem seu dia de “guarda” e pelo menos um período do dia a presença no assentamento é indispensável. È obrigatória a presença nas chamadas geral. Três faltas e o integrante “tá fora”.

Contou como foi o procedimento para chamar a atenção das autoridades para a regularização do assentamento.

“Quando invadimos a terra onde hoje estamos, ninguém tomou conhecimento. Nem o INCRA, nem ninguém. Foi feita uma assembléia geral onde foi definido que invadiríamos a fazenda Santa Rita. A intenção era só chamar a atenção. E assim foi feito. A polícia chegou e o mandado de reintegração foi expedido. Aceitamos o acordo para a retirada. Nossa proposta foi a regularização do assentamento Sebastião Bezerra com a presença do INCRA. Tudo certo. Mas foram dias e noites de pavor. Era como se estivéssemos em guerra. Aliás, todas as táticas ali eram táticas de guerrilha...”

Um detalhe me chamou a atenção. Foi quando meu conhecido falou dos “cursos”. De tempo em tempo integrantes que se oferecem, são enviados para participarem de cursos de lideranças em outros estados. A intenção é a formação de mais líderes desses movimentos populares. O custeio da viagem é feito pelos próprios integrantes da invasão. Cada um contribui com o que pode para o fortalecimento dos movimentos.

A alimentação no assentamento é por conta de cada família, mas existe um a corrente solidária entre as centenas de famílias.

É...enquanto movimentos desse tipo se organizam o poder público é deixado de lado. Novos líderes vão surgindo e o que deveria ser “oficial” passa a ser “paralelo”. Enfim, quando as regras são ditadas de forma bem pouco democrática, parece que a coisa flui melhor...ou estou enganada...vamos refletir...

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