Desde os tempos imemoriais, em qualquer lugar do país, materiais esportivos são distribuídos a quem precisa deles sem outro critério que não seja o do apadrinhamento político a times de futebol, associações religiosas, de moradores e grupos do tipo. Qual a diferença com estes materiais? O que está por trás desta denúncia agora? Por que a Folha ou outro grande jornal do país abriu espaço para a antiga prática de dar bolas e camisas justo no Tocantins ao invés de investigar como isso acontece em São Paulo, no Rio ou em BH?
Beneficiar com recursos públicos, ou bens públicos qualquer candidato numa disputa eleitoral é crime. Que seja uma bola e dois jogos de camisa. Que sejam R$ 100 mil em materiais esportivos. Não importa. A legislação eleitoral ficou mais rígida nos últimos anos, proibindo os brindes (lembram-se dos chaveiros, uniformes de time com nome de candidatos, bolas promocionais?), as camisetas e tudo que possa ser considerado moeda de troca por voto.
Se distribuir qualquer coisa ao eleitor passou a ser prática proibida desde a última eleição, que dirá dar ao eleitor, algo compro com dinheiro público? É crime duas vezes. Uma por que fere a lei eleitoral. Outro por que é malversação de recurso público. Por outro lado, não vi ninguém questionar se o material esportivo deixou de atingir seu fim. É bem difícil que isso tenha acontecido. Ninguém pediu bolas, chuteiras, camisas para não usar no “fomento ao esporte”.
O que dá o que pensar, neste caso, é a hipocrisia. Em campanha ou fora dela, a distribuição de material esportivo via secretarias estaduais e municipais nunca foi “licitada”. Vocês conhecem algum edital que tenha sido lançado para escolher quem vai receber bolas, camisas, ou cestas básicas? Eu nunca vi um. Este tipo de coisa, o governo e os municípios entregam a quem precisa, sejam associações esportivas, times de igreja, de associações de bairro. É uma distribuição feita sempre à critério de quem doa. Da autoridade que doa. Sempre foi assim, em Palmas, no interior do Tocantins, ou do Oiapoque ao Chuí.
Dito isso, alguém tem dúvida de que em todo lugar, ganha quem é ligado a algum político, seja ele vereador, deputado estadual, federal, prefeito? O Brasil inteiro funciona assim, isso não é privilégio do Tocantins. O que é de impressionar é que estas doações nunca tenham sido questionadas na grande imprensa. Nem na pequena. E sabem por quê? Por que não interessa a ninguém. Se a bola chegou ao pé do jogador, e a camisa cobriu o peito do menino que corre atrás da bola, cumpriu sua “função social”.
Mas agora interessa questionar, por que o que está em jogo é fomentar o clima de que há ilegalidade nas ações do governo do estado. O que rende páginas de jornais e comentários indignados é dizer: “Nossa! Mais uma irregularidade no governo Marcelo Miranda. Distribuíram bolas para um candidato a vereador trocar por votos lá em Goiatins...” ou “o gabinete da primeira-dama recebeu não sei quantos jogos de camisa para distribuir”. Me poupe de tanta inocência!
Entendo que a denúncia merece a apuração do Ministério Público. Uma vez comprovado que candidatos foram beneficiados com materiais adquiridos com recursos públicos, os responsáveis devem ser punidos, sem sombra de dúvida.
Mas eu tenho uma sugestão de pauta à Folha de S. Paulo: como foi feita a distribuição de bolas e camisas na prefeitura de Kassab que era prefeito, e foi reeleito? Tenho também outra sugestão ao Ministério Público: que tal estender a investigação e dar uma olhada nos critérios de distribuição desses materiais pelas prefeituras municipais que têm secretarias afins?
Assim, quem sabe caminharemos para dar transparência a tudo que se distribui ao público, à custa dos recursos públicos. Quanto ao que acontece no governo do Tocantins com os recursos do esporte - apesar do viés político que está evidente na tentativa de enfraquecer ainda mais o governador – as pessoas merecem uma resposta. Ou no mínimo, que os recursos sejam colocados de volta aos cofres públicos por quem os utilizou ao arrepio da lei. O que não dá pra fazer, à esta altura, é ignorar mais um problema.
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