Não é segredo para ninguém que o Tocantins é um Estado ainda dependente da máquina pública. Governo e prefeituras ainda são os maiores empregadores. Dados divulgados esta semana pela Secom na batalha entre governo e sindicatos para chegarem a um acordo em torno das progressões e seu pagamento mostram um número interessante: 84% dos recursos da folha são empregados com efetivos.
Traduzindo: ainda que haja um grande número de contratados, eles respondem por 16% destes recursos, que prudencialmente, não podem extrapolar nem comprometer mais de 50% da arrecadação do Estado.
Olhando a história recente do Tocantins, a massa de servidores públicos estaduais foi crescendo, se organizando e exigindo o fortalecimento de categorias específicas através de salários e benefícios. E suas conquistas foram chegando à medida que políticos e governantes começaram a perceber a força eleitoral que estas categorias representam. Com esta combinação, algo perigoso começou também a acontecer: aumentos acima do que era prudente, negociações comprometedoras sob o ponto de vista fiscal, uma verdadeira roda viva.
Ninguém quer ficar contra aumentos e benefícios
Voltando ao fatídico aumento dos 25%. Na semana em que ele chegou à Assembléia Legislativa, a bancada de governo comemorou. Discursos inflamados e emocionados foram feitos para registrar a magnanimidade do governador que o concedia. Marcelo Miranda - justiça seja feita - procurou organizar a relação Estado X Servidores com um Plano de Cargos e Salários,construído em parâmetros justos.
Mas a boa intenção não se materializou desta maneira, e deixou consequências. O governador à época havia contratado a Fundação Getúlio Vargas para um estudo, que ao final se transformou na tabela de progressões horizontais e verticais aprovadas e que hoje são cobradas pelos sindicatos por força de lei.
Partiu de uma assessoria ávida em construir o governador amigo do servidor aquele aumento sem quê nem por quê. Naquelas poucas mais de 24 horas em que o aumento chegou e foi votado, apenas uma voz, solitária, se ergueu para desconfiar que havia algo errado no cálculo. Empresário, habituado a acompanhar negociações de um dígito apenas de aumentos e correções, o deputado José Geraldo, do PTB estranhou e deu o alerta. Ficou isolado, como alguém que queria questionar um ato de bondade do governo com o servidor. Outro que teria estranhado, segundo me contou depois, foi o deputado Ângelo Agnolin, também familiarizado com as contas que não fecham.
Não deu outra: o aumento foi concedido, e uma semana depois revogado entre lágrimas e lamentações. Por um simples motivo: não dava para conceder sem comprometer as contas públicas. E por que revivo hoje esta pequena memória? Para ilustrar como as coisas acontecem quando são feitas no afogadilho, sem cálculo, sem projeção, sem imaginar e planejar o que pode vir depois.
A ação dos 25%, encampada pelo deputado Marcelo Lélis, ao lado do servidor público, e que tinha o objetivo de recuperar o direito que havia sido concedido, se arrastou durante mais de dois anos e foi às barras dos tribunais. Um acordo, celebrado depois entre o governo Carlos Gaguim e boa parcela dos servidores resolveu pontualmente a situação. Mas suas consequências ficaram.
Uma conta que aumenta a cada três anos e não acompanha a arrecadação
O fato é que agora, com o crescimento do número de servidores – e a obrigação de fazer concurso determinada pelo STF – as contas precisam de fato ser muito bem feitas. A tabela de progressões – cuja aplicação é legitimamente cobrada pelos sindicatos representativos dos servidores – é uma coisa escandalosa, e que deve urgentemente ser revista, sob pena de comprometer novas admissões e engessar a máquina pública do Estado.
Tem razão o governo, ao temer realizar concurso e admitir milhares de novos servidores públicos, com as regras atuais de progressões: uma escalada de três em três anos, que lança os salários às alturas (não que não sejam justos, mas se tornam impagáveis) e sem nenhuma trava efetivamente que garanta progressão por mérito, e dentro das condições do patrão – que somos nós, o público pagante de impostos, é bom lembrar – de garantir o pagamento.
Não tiro aqui em momento algum, a razão dos servidores em buscar o pagamento de seus salários, progressões e direitos devidos. Mas existe um processo muito errado e cruel em curso e que precisa ser repensado urgentemente: as tabelas da FGV que se tornaram lei criaram um monstrengo devorador dos recursos destinados a pagamento de pessoal.
E aí para finalizar esta reflexão de domingo, é bom lembrar que o Estado não é feito apenas de e para servidores públicos. Aliás, o conceito é inverso: o servidor público é o servidor do cidadão. Tem que ser bem pago sim, mas não pode perder de vista sua finalidade. Um Estado não pode ser maior que seu povo, nem sacrificar o cidadão anônimo – maioria absoluta – que por não estar atento ou ser tão organizado, deixa de gritar quando avançam sobre seu bolso desta maneira.
O desafio é encontrar o equilíbrio. Sindicatos precisam enxergar além da sua parte e ajudar a garantir o emprego e o salário não apenas para hoje, mas permanentemente. Sem sacrificar o contribuinte e principalmente a massa de excluídos, gente que está abaixo da linha da pobreza, esperando por políticas públicas eficientes que possam retirar deles a marca dos marginalizados. Para estes sim, deve ser a prioridade dos recursos do Estado.
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