O fantasma de Houdini ataca a cultura tocantinense

Inconformado com o "sumiço" do Fundo de Cultura na LOA encaminhada à Assembléia Legislativa, o jornalista e produtor cultural Melck Aquino faz sua análise sobre o fato. Veja aqui!...

O atual governador do Tocantins, Carlos Henrique Gaguim, assinou em janeiro deste ano, diante de um auditório lotado no Palácio Araguaia, o decreto que regulamentou a Lei Nº 1.402, assim instituindo o “Programa de Incentivo à Cultura- Pró-Cultura” e criando o Fundo de Cultura. Aliás, uma medida tardia da administração peemedebista, já que a lei havia sido aprovada ainda em setembro de 2003.

Naquele dia, eu estava presente, e junto com centenas de artistas, produtores culturais, prestadores de serviço do setor, aplaudi de pé um governador entusiasmado, que falava em resgate da cultura e incentivo às produções artísticas e que, enfim, atendia uma reivindicação acalentada por anos por todos.

Os recursos para o programa, a partir daquele momento uma lei regulamentada, previa 0,5% de toda a receita líquida tributária do Estado para o Fundo Estadual de Cultura. Os cálculos iniciais apontavam para um recurso estimado de R$ 6,5 milhões ainda em 2010, e o governador Gaguim ainda se apressou em anunciar a abertura de um crédito suplementar no orçamento, no valor de R$ 2.120.364,00 no para financiar os primeiros projetos.

Tudo muito bom, tudo muito bem, não fosse o fato de que tudo isto não passou de um grande espetáculo circense onde, agora eu entendo, os palhaços estavam na platéia, e os mágicos, mestres na arte do ilusionismo, no palco.

O que se viu no ano de 2010 foi um completo desrespeito à cadeia produtiva da cultura no Tocantins. Anúncio barulhento de caravana da cultura, que não passou da foto bem produzida e da ocupação dos espaços na imprensa. Editais que já haviam contemplado artistas, produtores, bandas e companhias teatrais, simplesmente cancelados. Editais irresponsavelmente, e com interesse eleitoreiro, lançados no apagar das luzes da exigência da legislação eleitoral, e que agora foram também engavetados. Artistas e prestadores de serviço com serviços prestados ao Estado atordoados com a Fundação Cultural do Tocantins que afirmou, inclusive na imprensa, que as dívidas das gestões anteriores não lhes diziam respeito. E, para completar, a perda de recursos federais oriundos de emendas parlamentares por não cumprimento de prazos, por falta de planejamento e capacidade gerencial. Um crime, para um Estado tão carente de investimentos em cultura.

E agora, como um soco no estômago, seguido de um gancho de direita no queixo, o Governo encaminha para a Assembléia Legislativa do Tocantins a Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2011, com um novo quadro de mágica, digno de um Houdini. Na LOA, simplesmente o Fundo de Cultura, e por conseqüência a lei que a rege, desapareceu. Simplesmente, não se previu um só centavo para o Fundo de Cultura, nem aquele para fazer o já manjado número de fazer a moeda sumir e depois reaparecer atrás da orelha de alguém da platéia.

O Ministério Público Estadual precisa agir o quanto antes. Primeiro porque a legislação diz que em respeito ao princípio da continuidade da administração pública, as dívidas assumidas pelo poder público são de responsabilidade deste, independentemente do gestor que a contraiu. Sendo assim, o gestor é responsável pelo pagamento de débitos deixados pelo seu antecessor, desde que legítimos, sob pena de incorrer em crime de improbidade administrativa. E precisa agir também porque o Governo simplesmente passou por cima de uma lei já devidamente regulamentada, e com previsão estipulada de 0,5% de toda a receita líquida tributária. Nossos deputados estaduais, claro, podem corrigir esta distorção ao analisarem a LOA, restituindo a previsão orçamentária para o Fundo de Cultura. Mas as ações do atual Governo, que pisoteiam a lei, não podem ficam impunes.

Por último, lembro aqui as palavras de Sérgio Mamberti, hoje um dos nomes mais destacados quando se fala em políticas públicas para a cultura no Brasil: “É dever do Estado, garantido na Constituição, dispor de recursos financeiros para o fomento e a implantação de política públicas capazes de incrementar o acesso à criação e à fruição dos bens culturais e o direito à informação, convertendo a cultura no veículo mais eficaz de inclusão social”.

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