TJ começa a desenrolar o nó dos excedentes no concurso vencido da Polícia Civil: faltou bom senso ao Estado

Começo de governo é um desencontro só de informações, interesses divergentes e luta de grupos para impor seu ponto de vista do que é melhor ou não para a administração pública. A decisão do Tribunal de Justiça no caso de dois excedentes do concurso d...

A decisão do Tribunal de Justiça que manda o Estado dar posse a dois classificados no Concurso de Delegados da Polícia Civil realizado em 2008, pode ser o começo do desfecho de uma situação que incomoda muita gente.

Homologado em 2009, o concurso público venceu em 26 de fevereiro deste ano sem prorrogação da sua validade pelo então secretário de Segurança, João Costa, por mais dois anos, como era possível ser feito. Era um certame amplo que buscava selecionar não só delegados de 1ª classe, mas agentes de polícia, escrivães, papiloscopistas, auxiliar de autópsia, perito crimina e legista. Em reportagem deste portal à época, o secretário disse que discutiria com o governador a viabilidade de fazer a prorrogação. Mas não o fez.

A conseqüência é que o Estado não poderá aproveitar administrativamente os excedentes deste concurso. Mesmo faltando gente, este pessoal só conseguirá acesso pela via judicial. Quem foi nomeado até o dia 26 de fevereiro, conquistou o direito de exercer o cargo. Quem não conseguiu pela via administrativa ser chamado arrasta mandado de segurança e ação ordinária pelos tribunais para ver seu direito reconhecido.

Ministério Público alertou e recomendou criação do cadastro reserva

Contra esta situação, o Ministério Público Estadual, através da promotoria de Justiça e Cidadania, fez seu alerta ao Estado ainda em 2008. Lembrou aos agentes públicos que mandavam os princípios da razoabilidade e da economicidade, que o Estado não excluísse na primeira etapa os candidatos que haviam obtido pontuação sem permitir que fizessem o curso de formação.

Alertava o MPE para o fato de que o quadro de delegados, agentes, escrivães, e todos os demais cargos cujas vagas foram oferecidas era insuficiente para a necessidade do Estado. E que mesmo que todos os classificados (incluindo um possível quadro de cadastro reserva que recomendava fosse criado) fossem chamados, ainda assim restaria 25% do quadro previsto para a Segurança sem preenchimento de vagas.

Não que o Estado ficasse com isto obrigado a chamar todos. Mas legalmente evitaria novos gastos com um novo concurso, se tivesse regularizado o cadastro reserva. Só que isto foi em 2008. De lá para cá o STJ assentou o entendimento que lá atrás o Ministério Público do Tocantins já demonstrava ter. De que quem obtém classificação num concurso destes, cria mais do que a expectativa do direito, mas uma espécie de "direito subjetivo" de assumir.

Recomendação era para não eliminar candidatos

A recomendação do promotor Marcelo Ulisses Sampaio, aos então secretários de Administração e Segurança era para que não eliminassem na primeira etapa os candidatos classificados, impedindo que estes fizessem o curso de formação. Desta forma, caso houvessem desistências(os aprovados em um concurso normalmente continuam prestando outros até passar num local mais próximo de casa, e acabam se desligando), haveriam sempre os reservas, prontos para serem chamados.

O Estado ignorou a recomendação. Quem conseguiu fazer academia (no caso dos delegados) foram os que encontraram uma brecha para obter decisão judicial obrigando o Estado a matriculá-los (como os que não passaram no psicotécnico).  Mas se um erro foi cometido à época, o outro foi a gota d’água este ano, com a negativa na prorrogação da validade do concurso. Esta poderia ser a chance de corrigir um problema grave, sem muito custo: faltam, como bem se vê, de agentes a delegados em praticamente todas as regiões do Estado.

É o que aponta a procuradora Elaine Marciano Pires no parecer bem fundamentado que apresentou ao analisar o caso de Ibanez Ayres e Wlademir Costa, em que o TJ terminou por reconhecer o direito de posse. Segundo a procuradora, só no caso dos delegados, existem 98 vagas em todo Tocantins, sendo 11 previstas no concurso que venceu (e que não foram chamados) e mais 87 criadas ano passado visando suprir carência levantada no sistema de segurança.

Resumo da ópera: a administração pública literalmente “enfiou os pés pelas mãos”, duas vezes. Lá atrás, quando ignorou a recomendação do MPE, e este ano, quando deixou de prorrogar o concurso por mais dois anos.

Outros candidatos cujo “direito subjetivo” de assumir foi ferido, ainda batalham nas esferas dos tribunais para ver seu direito reconhecido. Outros, que foram admitidos na esfera administrativa, lutam para permanecer, como é o caso dos dois delegados que estavam na ordem de classificação, foram preteridos quando o Estado deu posse a um classificado em ordem posterior a deles e entraram com recurso. Neste caso o governo reconheceu o erro anterior acatou o recurso e deu posse. Mas são delegados que sofrem ataques públicos, volta e meia por que não cursaram academia. E não cursaram por terem lá atrás, sido impedidos.

Um imbróglio aliás que não é só de dois ou três que entraram por último, mas de pelo menos uma dezena de delegados admitidos ao longo dos últimos anos e que não fizeram academia por um ou outro motivo. O que já é tema para outro artigo.

Por hoje, o que a decisão do TJ faz pensar, é que é possível evitar que tempo, esforço e recursos materiais e humanos sejam desperdiçados numa cansativa luta jurídica para fazer valer direitos.

Que o Estado não erre mais numa área tão delicada como a segurança, ao tomar decisões administrativas obtusas, que mais do que prejudicar uma centena de candidatos em concursos públicos, prejudicam o cidadão. Este que fica mal servido no atendimento a direitos básicos como o que tem à segurança. E que no mínimo passa vergonha quando delegacias frágeis do interior ( funcionando como cadeias públicas) cuidadas por agentes penitenciários desarmados, ou até por presos, vão parar em reportagens nacionais sobre o Tocantins no Fantástico.

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