Uma cachoeira de dúvidas e algumas certezas para lembrar

Já faz alguns dias que os bastidores da política tocantinense vinham trazendo nas rodas na Assembléia e no burburinho dos cafés, os rumores de que as conexões de Carlos Cachoeira no Tocantins iriam "estourar"....

Como quem conta um conto aumenta um ponto, os nomes que surgiam neste "boca a boca" dos que têm pouco a fazer e muito a especular eram os mais variados. Pois bem, a matéria da revista Época que cita Marcelo Miranda a Eduardo Siqueira em conversas entre Cachoeira e seus companheiros de negócio é bem sugestiva, mas pouco conclusiva.

De um lado, Marcelo seria beneficiado por uma suposta interferência de Demóstenes Torres - o arauto da Ficha Limpa - junto à Luiz Fux, para que seu caso fosse julgado favorável. O que os fatos mostraram: Fux deu uma decisão favorável que não se sustentou diante de uma análise que o próprio refez dias depois. E Vicentinho Alves prosseguiu senador.

De outro lado, Eduardo Siqueira teria prometido a um aliado de Cachoeira, diretor afastado da Delta, a terceirização do serviço de inspeção veicular que o Detran faz com estrutura própria de pessoal. Um ano depois, nada disto se confirmou.

A revista traz agora escutas de um ano atrás, lançando dois nomes conhecidos da política tocantinense na cachoeira de lama que escorre do noticiário nacional. De concreto mesmo, sem nenhuma consequência prática, além de alimentar o falatório que já vai nas ruas.

Conversando ontem com Marcelo Miranda e com Eduardo Siqueira por telefone, ouvi a mesma história em versões pouco diferentes. Carlos Cachoeira é sobejamente conhecido em Goiás, onde muitos de nós ainda circulamos - cada um na sua esfera de convivência, é claro - e não era difícil ser encontrado na companhia de empresários e políticos.

Tanto um quanto o outro afirma não ter nada a temer nos grampos feitos pela PF quando começou a monitorar Cachoeira. E de fato, foram citados, mas nenhum deles (ao que se saiba até agora) foi gravado conversando, pedindo algo ou combinando favores com o bicheiro.

Assim como Cachoeira, outros empresários e personalidades sob suspeita de negócios escusos circulam por aí. Suspeitas, até serem confirmadas, são suspeitas. Depois de comprovadas, confirmadas, é outra coisa.

A alta sociedade, seja no meio político ou empresarial, é useira e vezeira em cortejar os poderosos em cada esfera, até que eles caiam em desgraça na opinião pública. E depois os evita como antigamente se evitava os leprosos.

Mas faço este contraponto nesta sexta-feira da Paixão de Cristo, para relembrar um velho sermão do Padre Antonio Vieira, que escuto nesta manhã na casa do vereador Osman Freire, do PT de Aurora, para onde vim ontem de manhã, antes da "bomba" da Época estourar.

Nele, o padre, lá nos idos de 1800, fazia diferença entre dois tipos de ladrão: os que roubam para matar a fome, ou roubam uma roupa para vestir, e os que roubam o povo. Dizia ele do alto de sua sabedoria: "uns roubam para comer, e são enforcados (...) outros roubam e enforcam". Quão atual este discurso, relido no contexto dos fatos atuais que a cada dia são revelados e não têm o dom de assombrar profundamente mais.

No portal da CBN, um comentário de Arnaldo Jabor intitulado: "Não existem inocentes na política" é ainda mais contundente, Relembrando Padre Vieira, o jornalista diz: "Na política hoje em dia não existem inocentes, todos são cúmplices".

O problema da corrupção no Brasil, que vem lá dos tempos do Império, é justamente este: impregnou a máquina pública e as relações de poder de tal maneira, que generalizou-se a impressão de que são todos culpados. Pois bem, ouso nesta sexta-feira, dizer que nem todos são ladrões, e nem todos são cúmplices dos ladrões.

Há muito que corrigir e passar a limpo nas relações entre empresários e governos. Mas não vamos misturar tudo como se ninguém valesse a pena. Nossos políticos são o produto do nosso sistema. Nossos representantes são aqueles em quem votamos. Outra eleição se aproxima. Tomara que a cachoeira de lama, de dúvidas e dissabores que deságua no vizinho Goiás, não venha contaminar as águas do nosso Tocantins.

E por aqui, que a gente saiba escolher nossos representantes nas águas límpidas que ainda restarem. Vamos escolher os que ainda não foram contaminados. Vamos acreditar que ainda existem os homens e mulheres de boa vontade. Para que tanto pessimismo não nos contamine a alma.

Eu acredito que ainda é possível fazer escolhas diferentes. E construir caminhos positivos. É sempre possível recomeçar. Que esta seja uma boa mensagem de Páscoa a todos os que são Cristãos. Ou não.

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