Veja se iguala à Contigo, dá munição a oposição e abre a semana colocando em pauta os limites do jornalismo

Comprei a revista Veja depois de muito tempo, para ler a reportagem de capa, "O poderoso Chefão", que traz o ex-ministro José Dirceu com pinta de playboy. Dentro, as fotos que revelam visitas feitas ao "Zé" mais poderoso do PT, um...

Depois de ler a reportagem completa que estampa a capa da revista Veja da semana, mais ampla do que a versão disponível na internet, algumas coisas ficam claras.

O “ministro”, como ainda é chamado José Dirceu (PT), circula e se articula no governo Dilma com uma desenvoltura invejável a outros líderes partidários, que diferente dele não respondem a investigação pela procuradoria geral da República. E exerce dentro do PT uma influência comparável a poucos na hierarquia partidária do partido que comanda o Brasil há quase nove anos.

Fora isso, o leitor tocantinense pode se perguntar: o que faziam de fato lá naquele dia, Eduardo Gomes e Eduardo Siqueira? O que havia na sacola que entrou e não saiu da suíte do Hotel Naoum nas mãos do ex-senador que disse à Veja que mantém interlocução com Zé Dirceu em razão do acordo que tem com o PT no Tocantins.

E o "Zé" surge como interlocutor sobre o PT do Tocantins

Ninguém pode dizer que Eduardo mentiu: já é sabido por todos que acompanham a política tocantinense que o PT tem um acordo com o governo desde que se aliou para eleger Raimundo Moreira na presidência da Assembléia. Até ai é uma decisão legítima, autorizada por aquelas 559 reuniões intermináveis.

É certo que o partido ainda posa de independente, mas na verdade está tão “de casa”, que seus deputados pautam reuniões com o secretário de Planejamento, levam prefeitos e resolvem problemas com a desenvoltura de poucos “companheiros” eleitos na base governista. Fato.

A clareza das relações do governo com o PT regional poderá ser vista com mais transparência nas eleições do ano que vem. Fala-se por exemplo, que em Colinas, José Santana terá o apoio do governo. Não é de se duvidar. O prefeito vem ajudando construir uma unidade de interesses entre o governo e o partido há muito tempo. Mas é uma decisão que pode desagradar a muitos companheiros mais antigos.

Os limites da lei e as transgressões da profissão de jornalista

Voltando à Veja. Li vários artigos no final de semana entre os que defendem a reportagem de capa da revista, e outros que destroem qualquer tentativa de tratá-la como matéria jornalística. Não são poucos os que afirmam que a revista cruzou uma linha perigosa ao instalar um jornalista ao lado da suíte de José Dirceu para que desta forma este pudesse vigiá-la. Ilegal seria invadi-la. E há a suspeita de que as imagens reproduzidas não são do circuito de câmeras do Hotel, mas de câmera oculta plantada pelo repórter.

Invasões, gravações não autorizadas,fazem parte dos recursos utilizados por jornalistas em todo mundo em ocasiões extremas. São mais comuns no entanto, em campanhas políticas, quando entra em campo aquele jogo de “vale tudo” para destruir um adversário. O estranho é que os recursos utilizados pela revista, no final não revelaramm nenhum crime. Não há efetivamente nada de errado em que José Dirceu tenha uma suíte no Naoum que custe R$ 500,00 reais por dia, pagos por um escritório de advocacia. Isso se chama lobby e não se pode dizer que é ilegal, até que se prove alguma transação que tenha burlado a lei.

Eu mesma ao longo dos muitos anos de jornalismo, já “forcei a barra” para conseguir furos e boas matérias. O HDT- Hospital de Doenças Tropicais, em Goiânia, “invadi” duas vezes no final da década de 80. A primeira, pulando o muro dos fundos, com o fotógrafo Eduardo, ex-colega de equipe no Diário da Manhã, para documentar descarte irregular de lixo hospitalar. Valeu a pena: o crime era deles e contra a saúde pública. No meu caso, foi uma transgressão das normais, e gosto de pensar que seja das perdoáveis.

 Eram tempos de jornalismo poético: correr atrás da notícia a qualquer custo, fazer grandes reportagens indo até onde a maioria não se atreveria, quebrar algumas regras para prestar algum serviço relevante com aquela informação. Não estávamos a serviço de produzir peças políticas contra ou a favor de ninguém.

Acho que ainda hoje os bons jornalistas em todo mundo se arriscam a alguma transgressão para conseguir seus “furos”. No caso de Zé Dirceu e do jornalista da Veja fico pensando o que ele esperava achar se conseguisse entrar na suíte do petista: pilhas de notas de R$ 100? Documentos comprometedores? Dá o que pensar.

Leva e trás em alto estilo desmascara suposta conspiração

O caso é que mesmo fora de período eleitoral, a suposta tentativa de invasão e a instalação de câmeras ocultas, prestaram um serviço à presidenta Dilma: saber um pouco mais sobre como se movimenta o poderoso Zé, e quem o visita em momentos de crise do Planalto. Nada mais.

Para nós, reles mortais, a Veja da semana ficou a cara da Contigo. Revelando a intimidade de celebridades, só que desta vez, não as do meio artístico, mas as do meio político.

O que sobra de sério nisto tudo é uma reflexão sobre princípios do jornalismo: até que ponto se pode ir atrás de uma matéria? Além do limite da lei, mesmo que não seja para revelar um crime? E mais: como a sociedade entende estes recursos dos quais se lança mão hoje em dia? Aprovaria ou reprovaria?

O máximo que a revsita fez foi colocar algumas interrogações na cabeça das pessoas. E fazer em público, um leva e trás que normalmente os políticos fazem nos bastidores. A reação do “Zé”, foi ir a polícia. A opinião pública, nas redes sociais está dividida.

E por aqui a semana começa com munição para a oposição ir à tribuna da Assembléia perguntar o que há por trás do acordo do PT com o governo. E o que tinha dentro da sacola que Eduardo não se lembra de ter levado a Zé Dirceu.

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