Gadotti antecipa voto e diz que decreto é “desnecessário": dura lex, sed lex

A disputa eleitoral deste ano ganhará mais um capítulo na justiça esta semana, no TRE, mas o que a opinião pública aguarda é o desfecho da liminar das Contas de Miranda no TJ, semana que vem...

Gadotti: longos anos de TJ e muita influência
Descrição: Gadotti: longos anos de TJ e muita influência Crédito: Divulgação

Assistiremos a um capítulo interessante para justiça tocantinense e sua liberdade de sentenciar independente do que pensa e quer o Executivo, nos próximos dias.

 

Na verdade, são dois. Primeiro, esta semana no TRE, deve entrar em pauta o embargo que Sandoval Cardoso, via assessoria jurídica, move contra o registro de Marcelo Lélis(PV).

 

Outro capítulo acontece no Tribunal de Justiça semana que vem, quando deve retornar à pauta o Agravo que a Assembléia Legislativa move contra a liminar concedida pela juíza Célia Regina, no mandado de segurança de Marcelo Miranda contra o decreto legislativo que publicou a rejeição de suas contas.

 

Interessante o momento que vive a Justiça tocantinense. Um nítido momento de transição.

 

O calor do debate eleitoral tem posto à prova a serenidade de uns e o equilíbrio de outros, mas não deve afetar as instituições. Por mais que elas sejam constituídas de homens e mulheres vulneráveis.

 

No primeiro caso, o registro está concedido a Lélis. A defesa da coligação governista tenta derrubá-lo, contando que o TRE rejeite os embargos declaratórios e assim conclua o rito do julgamento da sua própria sentença, cujos efeitos levam à inelegibilidade. Assim seria possível ao TRE rever o registro concedido.

 

É sabido que à decisão do TRE, seja ela qual for, cabe recurso ao TSE. O caso de Marcelo Lélis portanto é daqueles que deve arrastar-se às barras do tribunal superior. Coisa que não termina de ser julgada antes da eleição.

 

No dia do registro, prevaleceu a letra fria da lei no TRE. Se não havia trânsito em julgado, não havia inelegibilidade imputada a Lélis.

 

Prevaleceu entre os juízes eleitorais a máxima: Dura Lex, Sed, Lex, ou “A Lei é dura, mas é a lei”. Para todos.

 

Um tribunal em busca de si mesmo

 

Já a cena que se passou no Tribunal de Justiça semana passada, quando a liminar concedida ao mandado de segurança chama atenção e merece uma análise.

 

A juíza relatora, a mesma que concedeu a liminar, Célia Regina Régis, manteve seu voto. Em seguida a ela o desembargador José de Moura Filho pediu vistas do processo. A presidente do TJ então questionou se algum dos desembargadores desejava antecipar seu voto.

 

Curiosamente, o desembargador Luiz Aparecido Gadotti antecipou seu voto, no que foi acompanhado pelo desembargador Helvécio de Brito Maia Neto. Curiosamente, por que poderia votar no retorno do processo e do voto de Moura. A antecipação, a princípio não tem nenhum efeito. Nos bastidores no entanto corre que atitude pode gerar influência sobre o voto de outros desembargadores, que têm em Gadotti uma referência.

 

E em que sentido seria esta influência?

 

Contrário à liminar e favorável ao agravo que a Assembléia Legislativa. Este é o voto. Agravo que a Casa interpõe para tentar salvar o decreto, que de fato publica a rejeição de contas de Miranda, votada novamente no final do período legislativo, com o objetivo claro de isentar Carlos Gaguim da rejeição e seus efeitos, como se viu. Uma decisão, como qualquer leigo sabe, só vale após publicada. A ela só se recorre diante dos termos da publicação. E Miranda só teve acesso a ela, segundo seus advogados, na primeira semana de julho.

 

Lendo o voto do desembargador, percebe-se a riqueza da linha de raciocínio adotada para defender ao final, em síntese, que não se dê seguimento ao mandado de segurança de Miranda (por intempestividade) e que se conceda o agravo, derrubando a liminar.

 

Para Gadotti, o decreto é “desnecessário”, uma vez que a rejeição das contas o precede. Ele seria apenas um ato formal, inventado pelo regimento e que não acrescentaria nada ao rito  legislativo.

 

No voto que antecipou, o desembargador sustenta ainda que o regimento é omisso quanto a  definir se sua aprovação deve acontecer em um ou dois turnos. As contas, conforme o regimento, devem ser votadas em turno único.

 

A Constituição Estadual, no entanto, não é omissa quanto ao modo como devem ser votadas as contas de mandatário: em dois turnos. Respeitada a letra fria da lei, o que vale mais: o regimento interno ou a Constituição? O voto do desembargador não chega a abordar este conflito.

 

No Congresso Nacional, por exemplo, cada Casa Legislativa vota uma vez as contas. O que na prática é uma votação em dois turnos: a Câmara vota uma vez e o Senado vota outra.

 

Na semana que vem o Tribunal de Justiça deve voltar a discutir em sua pauta, uma matéria que ao fim e ao cabo, é sobre a validade do que diz a Constituição Estadual.

 

Por mais argumentos que se encontrem para defender isto ou aquilo, no meio de um processo eleitoral, não há como fugir da velha máxima: se a Constituição do Estado ainda está valendo o decreto que valida as contas votadas em apenas um turno é Inconstitucional.

 

Aí vale um parêntese.

 

Numa conversa de advogados sobre o tema outro dia, um deles -  favorável a Coligação governista -  afirmou: “mas é um absurdo dizer que a votação em turno único está errada! A vida inteira foi feito assim”.

 

Ao que o outro, professor de direito, retrucou com bom humor: “é simples, quer dizer que a vida inteira foi feito errado”.

 

Fecha parênteses.

 

Pode ser que o desembargador Gadotti tenha razão e o decreto legislativo seja de fato um rito regimental desnecessário. Mas por enquanto ele está no regimento da Casa. E o regimento está em vigor.

 

Pode até ser que a Constituição deva ser alterada, mas ainda não foi. Do alto do respeito que conquistou pela sua atuação ao longo dos anos no Tribunal, é possível que o desembargador Gadotti influencie seus colegas a seguir seu entendimento do caso.

 

De outro lado sempre pode haver quem – sabendo onde isso vai dar - se paute pelo que de fato está escrito na fria letra da lei.

 

Dura Lex, Sed Lex. O senso de justiça manda que ela valha no Tocantins, como no resto do mundo, em período eleitoral ou fora dele, para amigos ou inimigos.

 

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