Semanalmente atos de violência urbana invadem os noticiários, causando perplexidade e comoção pública. Mas nada muda. Entra ano e sai ano e a situação continua a mesma.
Já existe o consenso de que o problema da violência urbana não está restringido apenas ao sistema de policiamento, embora ele faça parte das soluções para o problema.
Esse problema tem início na família com agressões de toda natureza aos filhos; a desestruturação dos lares; a miséria; a cultura da violência; o conjunto de um péssimo ensino escolar; a proibição das escolas confessionais em ensinarem sua fé; o falso moralismo social; a corrupção; sistema carcerário deplorável; legislação penal frouxa e o sentimento de impunidade, entre outros, tem alimentado a violência urbana.
A família é o berço da formação de toda pessoa. A ausência de uma boa formação familiar, onde os valores de cada pessoa são estabelecidos, representa uma das origens da violência urbana, principalmente da violência contra a mulher, onde até hoje existe a cultura de que uma mulher pode ser agredida pelo homem. Esse valor ou a ausência dele, o respeito à mulher, começa a ser estabelecido dentro da família e assim, todos os demais valores.
Em seguida temos as escolas que contribuem decisivamente para a má formação das crianças e adultos, que logo em seguida estarão dirigindo as próximas famílias, as empresas, o estado, criando e aplicando leis, e assim por diante. A corrupção começa ali, com a cultura endêmica da cola (apropriar-se indevidamente do conhecimento do outro). As crianças são submetidas ao longo de sua formação escolar a um sistema onde a cola impera. Chega à faculdade com essa prática impregnada na mente, no desejo e na conduta. A cola representa o primeiro ato de corrupção praticado por uma criança e que perdura durante toda a sua vida. Novamente, a ausência de valores morais sólidos solapam a formação das pessoas.
Essas crianças e adultos aprenderam que para terminar sua formação escolar precisam colar, seguindo o ditado popular de que “quem não cola, não sai da escola”. Assim, a corrupção tem início. Esses pequenos corruptos irão se transformar em médicos, advogados, juízes, promotores, policiais, empresários, vereadores, deputados, senadores, prefeitos, governadores, presidentes da república e assim por diante. A desonestidade que teve início na escola, como prática corriqueira, fatalmente irá continuar na vida adulta e em todas as relações estabelecidas por esses profissionais. Essa corrupção comportamental contribui decisivamente para a manutenção das coisas como estão. Quando aplicada aos setores que deveriam combater a violência urbana, em todos os seus níveis, tem exatamente o efeito contrário.
Outro fator que tem alimentado a violência urbana é a própria cultura entranhada no comportamento social. A ideia de que bandido bom é bandido morto. A autorização tácita que se confere ao sistema policial (civil e militar) para matar bandido. No Brasil mata-se cada vez mais. Ideia essa aliada a de que o sistema carcerário deve se transformar num verdadeiro purgatório ou no próprio inferno. Sentimento dessa natureza, que é alimentado todos os dias sem um combate sério e eficaz por parte da própria sociedade e dos governos, tem alimentado uma rotina de violência sem fim.
A frouxidão das leis penais é outro ponto sério. As baixas penas para os crimes cometidos contra a vida e contra o patrimônio alimenta a escalada da violência. A maioridade penal estabelecida apenas aos 18 anos é um incentivo para que menores entre os 16 e 18 anos sejam usados sistematicamente para a prática de crimes. E mais, mesmo que não estejam a serviço de nenhuma organização criminosa, sentem-se livres para a prática de furtos, roubos, homicídios e latrocínios. É bem verdade que a redução da maioridade penal não vai resolver todo o problema da violência urbana, mas vai contribuir significativamente.
É necessário criar um sistema carcerário que funcione. Onde o preso cumpra a pena integralmente a que foi condenado. Para isso, presídios novos e modernos precisam ser construídos. Os governos não constroem presídios por que são alimentados pela falsa ideia de que devem construir somente escolas. Precisamos de excelentes escolas. Mas também precisamos de bons presídios para abrigar aqueles que praticam crimes. Essas pessoas precisam ter o direito de cumprirem suas penas e trabalharem durante o cumprimento dessas penas.
O falso moralismo social que impede o livre comércio da maconha, por exemplo, tem servido tão somente para encher de dinheiro o bolso dos traficantes, encher as cadeias de jovens pobres e ainda corromper muitos setores da polícia civil e militar. Essa situação precisa ser discutida de forma mais racional. A bebida, por exemplo, que causa o mesmo mal, é livremente comercializada e ainda tem incentivado o seu consumo.
Enquanto esses problemas não forem enfrentados, a violência urbana continuará campeando solta.
É isso.
Marcelo Cordeiro é advogado, pós-graduado em administração pública, mestrando em Direito Constitucional pelo IDP, ex-juiz do TRE/TO. Escreve todas as segundas na coluna Falando de Direito.
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