Assembleia dá sinal de alerta ao governo: o antes, o durante e depois dos vetos

Base do governo revela fratura exposta no dia em que a Casa impõe pela primeira vez uma derrota por três vezes seguidas a um governador. Insatisfeito, Mourão desabafa e pode deixar liderança...

Escrevi aqui há alguns dias, que a base do governo na Assembléia é flutuante: tinha de fato nove deputados com quem pode contar, dois na oposição extrema, dez no grupo do deputado Osires Damaso e mais três que podem variar de posição. O normal, no final do último semestre era que a oposição, quando muito, reunisse oito votos contra um projeto do governador. Pois a história, de fato, mudou e é outro o cenário neste momento na Casa.

 

As votações ocorridas na Casa nesta terça-feira, 1o de setembro, provaram a tese e terminaram com um forte sabor amargo de derrota para o governo, revelando de público o que já se escutava nos bastidores: a base, na verdade está insatisfeita, esfacelada.

 

Por mais que o discurso dos deputados que votaram pela derrubada dos vetos seja de que apoiaram a classe produtiva (no caso da manutenção da alíquota do Diesel, e do escalonamento dos benefícios do Pró-Indústria, que aumentou o número de frigoríficos a serem atendidos) os motivos vão muito além.

 

Falta do pagamento de emendas impositivas dos parlamentares - que representam 1% do orçamento do Estado - falta de um melhor relacionamento do secretariado com os parlamentares ditos da base do governo, falta do repasse integral dos recursos da Casa por parte do Executivo (Assembléia deve fornecedores, num atraso nunca visto em sua história e está se concentrando apenas em pagar a folha). Estes são os motivos reais da crise, que se escuta “em off”, nos bastidores.

 

Raros são os deputados que registraram pagamento entre R$ 400 mil a R$ 500 mil das suas emendas. “Houve uma reunião na sala vip, no semestre passado em que o secretário da Fazenda e o do Planejamento se comprometeram, junto com o líder do governo, de que nós entraríamos agosto com R$ 500 mil de emendas pagas”, disse um parlamentar ao T1. Poucos, bem poucos podem considerar o compromisso cumprido: “contam-se no dedo de uma mão”, disse outro.

 

O fato, segundo uma fonte palaciana, é que não tem dinheiro em caixa. Não há liquidez para liquidar emendas. Por mais impositivas que sejam. “Eles precisam seguir o exemplo de outros órgãos como o TCE e o TJ que estão conrtando despesas”, sugere a fonte.

 

Mas nem só de emendas é feito o descontentamento dos deputados. A base reclama, e muito, do secretariado. De que não recebem os deputados e quando recebem não atendem as demandas. De que secretários evitam ir à Assembléia participar de audiências públicas, dificultando o debate.

 

“Se os secretários já são pouco representativos da vontade do governo, imagina seus representantes”, alfinetou um oposicionista. 

 

Da independência de Nilton Franco ao poder de articulação de Damaso

 

Uma discussão entre o deputado Paulo Mourão - líder do governo, que externou nesta terça toda sua insatisfação e pode deixar a liderança nos próximos dias - e o deputado Nilton Franco, revela bem o cenário da crise na própria bancada de Miranda na Assembleia.

 

Semana passada Mourão chamou a atenção quando Nilton Franco votou contra o governo e favor de sua emenda, no caso do Redaf, na CCJ: “deputado da base, vota com o governo”.

 

Esta semana, Nilton devolveu a resposta. “Semana passada o senhor disse que deputado da base tem que votar com o governo, mas eu quero lhe dizer que votarei sempre com a minha consciência”. Ao que Mourão respondeu: “é verdade, eu disse isso. Mas também me reservo o direito de votar com a minha consciência quando entender que ela está acima do que o governo estiver propondo”.

 

Mourão, insatisfeito, também é alvo de insatisfação de alguns deputados, que tem deixado isso claro para o governador. De um dos mais ferrenhos marcelistas ouvi que desde o episódio da sua derrota para presidência ele é visto nos bastidores como representante da vontade de Marcelo e não como alguém que representa o interesse dos deputados.

 

A amigos no entanto o deputado tem deixado outra versão dos fatos: de que o que constrói, o governo destrói, ao não cumprir compromissos assumidos com deputados.

 

Nilton Franco, por sua vez, viveu seu dia de glória junto à sua base, da Sefaz. Ele, que é auditor de carreira, conseguiu manter o benefício do Redaf que o governo havia vetado. No caso do veto ao Pró-Indústria, foi de Nilton Franco a emenda que incluiu um escalonamento ampliando os benefícios que se reduziam antes a empresa do porte da JBS.

 

Mas se o peemedebsita de Pium teve uma terça-feira de vitórias, o mesmo pode-se dizer de Osires Damaso, que mais uma vez mostrou poder de articulação do grupo dos 10.

 

Uma reunião do grupo anterior à votação já desenhava o que o dia traria. Articulando um bloco, onde estão Vilmar do Detran, Olyntho Neto, os deputados do Solidariedade entre outros, Damaso conseguiu em algumas votações os mesmos votos que teve para ser presidente da Casa.

 

Com o governo, ficaram abertamente: Paulo Mourão, Valdemar Júnior, Elenil da Penha, José Roberto, Valderez Castelo Branco, Ricardo Ayres, Rocha Miranda e Toinho Andrade. Jose Bonifácio votou com o governo em alguns projetos e em outros não.

 

Em silêncio, votaram Eduardo do Dertins, Cleiton Cardoso, Júnior Evangelista, Jorge Frederico, entre outros. Ausente, só o deputado Eli Borges, que fez aniversário na terça e não compareceu às votações.

 

Se ficou algum recado ao governo nesta terça-feira, é que sua base precisa urgentemente de reparos. Mais diálogo, ajuste nas contas, melhor tratamento.

 

A situação me lembrou, de novo o começo do governo Siqueira. Naquela época, como Marcelo agora, Siqueira se elegeu governador com poucos deputados. Ficou no 12 a 12 muito tempo, até ir construindo sua base. Ouvi naqueles primeiros meses da boca de Eduardo Siquera, então o todo poderoso articulador político do governo, que seu pai não queria “encher demais o barco”. Ou seja: ia trabalhar com a maioria necessária, mas não ia inflar a base para não inflar o custo de manter uma base grande demais.

 

Numa situação que alega ser bem pior que aquela, talvez esteja faltando esta compreensão ao governo Marcelo Miranda e seus articuladores políticos: base menor é base melhor atendida. Do jeito que está, a crise tende a se agravar. Se hoje o sinal é amarelo, amanhã pode ser vermelho.

 

De toda forma, por motivos justos ou não, o Parlamento tocantinense impôs pela primeira vez, uma derrota a um governador. Estes vetos entraram definitivamente para a história.

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