Crise de credibilidade atinge Dilma, Lula e cria o falso herói brasileiro, Moro

No momento em que Dilma avança pra confirmar o ex-presidente Lula como Ministro da Casa Civil, uma crise política e de credibilidade mergulha o País em protestos que podem levar ao fim do governo

Lula e Dilma Rousseff
Descrição: Lula e Dilma Rousseff Crédito: Foto: Da Web

O PT falhou em distanciar-se de tudo que combateu ao longo dos anos desde sua criação, até assumir o poder, com o ex-presidente Lula, após uma longa luta contra as elites brasileiras, encasteladas em partidos, em jornais tradicionais e canais de TV.

 

Foram oito anos de Lula, e com ele de inegáveis avanços sociais. Foram quatro anos de Dilma, reeleita com dificuldade, para levar adiante as mesmas causas sociais. No quinto ano dela, a era Lula-Dilma-PT encara seu fim.

 

Faço parte da geração de jornalistas que viveu a transição entre o tempo da verdade que se lia nos jornais - ao gosto do patrão - e as suas várias faces, lidas, vistas e ouvidas em toda parte: blogs, portais, redes sociais e nos grandes jornais, mais a televisão.

 

Não estranho o conteúdo dos áudios divulgados - e não vazados - para a Rede Globo de televisão, com exclusividade e preferência, por determinação do Juiz Sérgio Moro. Fontes têm veículos preferenciais. Moro gosta da Globo, onde sua popularidade foi elevada aos limites. A Globo gosta de Moro. É um casamento perfeito de interesses e intenções. Basta ler  e observar a história.

 

Num cenário de palavras de ordem contra a corrupção, ouvir a mesma mensagem o dia todo, tem o poder de levar as pessoas às ruas tomadas por uma indignação potencializada ao extremo. É o que está acontecendo desde ontem, quando uma conversa entre Dilma e Lula demonstra que a presidente mandou ao ex-presidente um termo de posse para ser usado “em caso de necessidade”.

 

Está clara a intenção. Lula não poderia receber uma ordem de prisão, por parte do juiz Moro, da Justiça Federal de Curitiba -  ironizada como a República de Curitiba por ele num telefonema também divulgado -  sem que estivesse salvaguardado.

 

Muitos sustentam o argumento de que Dilma agiu assim, obstruindo a Justiça e por isso, criou mais um motivo para seu impeachment. Outros afirmam que se não havia ordem de prisão expedida, não houve obstrução da Justiça. Outros ainda argumentam que se Lula continuará a ser investigado pelo Supremo Tribunal Federal, não há obstrução, em nenhuma hipótese. Há escolha de foro.

 

O crime de Dilma então foi decidir que, alçando Lula a Ministro chefe da Casa Civil, ele só poderia ser investigado pelo Supremo Tribunal Federal. Que o próprio Lula conceitua em um dos seus mais autênticos desabafos, como “um tribunal acovardado”.

 

Os áudios, todos, abertos, escancarados, mergulharam o País num frenesi desde ontem a noite. São compartilhados via WhatsApp, e publicados nas redes. Viralizam e ganham memes. Estamos vivendo a catarse da República virada do avesso, exposta nas entranhas. Sem censura, com direito a palavrões e sorrisos compartilhados com ironia.

 

Ainda vamos apurar, baixada a poeira, o que há de criminoso e o que há de desabafo legítimo nos áudios de Lula que se sente perseguido, acuado, por forças políticas contrárias, sob o manto da justiça.

 

Mas vamos desligar a televisão só por um momento. Vamos calar os comentaristas da Band News e da Globo News. Vamos desligar os áudios - dos quais já decorei até o “tchau querida!”- e pensar.

 

O PT perdeu as condições éticas de governar o País, ao se igualar a todos os partidos de direita no modus operandi de levantar recursos para campanhas, usando caixa dois e doações de empresas? Sim…

 

O PT e a presidente Dilma demonstraram ter o mesmo modus operandi de proteger os companheiros na hora da crise, hábito de todos os partidos de direita? Sim.

 

Mas o PT é o único partido corrupto do País? Não…

 

O sucessor da presidente Dilma, em caso de renúncia ou impeachment, tem histórico diferente e está limpo? Não... 

 

Caso Dilma e Temer sejam afastados pelo TSE - uma das possibilidades reais - numa decisão técnica e não política, quem assume na linha sucessória, Eduardo Cunha, está limpo? De jeito nenhum…

 

Triste situação a que chegamos. Uma República em crise, com a ética em farrapos.

 

E a ética do Juiz Moro? Qual é? Tão convicto do seu papel de super-herói, que já dizia o jornalista Paulo Nogueira, “pensa que pode voar”. Tão ensimesmado que é capaz de mandar divulgar um áudio em rede aberta de televisão, envolvendo a presidente da República, após perder o controle sobre seu alvo preferencial, numa espécie de “vingança”, um ato final.

 

Muito do que Moro fez ontem é questionável. A nota divulgada pela Polícia Federal deixa claro: o juiz determinou a suspensão do monitoramento telefônico, mas a operadora só suspendeu o sinal horas depois. No intervalo, o que foi gravado, foi divulgado, nitidamente com a intenção de incendiar o cenário político.

 

Desconfio de juiz justiceiro. Que se acha o Superman. Que acha que pode moldar as leis ao seu gosto, e aos seus interesses. É assim que Moro tem agido, mas deixou claro, sem sombras de dúvidas, no dia em que mandou conduzir coercivamente Lula para depor, sem que ele tivesse se recusado a comparecer a qualquer depoimento.

 

Moro já extrapolou antes, e extrapolou agora.

 

“Ah, mas é por uma boa causa!”, afirmam os anti-Lula, anti-Dilma e anti-PT em sua defesa.

 

Não concordo, para mim está claro. O juiz fez uma escolha: optou pelas ruas ao invés dos tribunais.

 

Antecipou o julgamento político e popular, usando a grande mídia, um veículo de comunicação de massa. De caso pensado.

 

Que os bandidos de colarinho branco, de todos os partidos, são perniciosos, isso a gente já sabia.

 

Mas um juiz fazendo sua justiça particular com as próprias mãos é de assustar.

 

O governo Dilma caminha agora para o fim. Por bem menos que isso, Collor foi cassado. Uma crise destas, de credibilidade, nunca foi vista antes na história. Resta saber quanto tempo levará. Até quando, a partir de ontem, Dilma sangrará na praça, com Lula a tiracolo.

 

Não há ilusão: esta não é até aqui, uma luta dos impolutos contra os corruptos. É uma luta de corruptos contra corruptos, com o povo de massa de manobra, no meio.

 

É uma guerra da direita contra a esquerda. É uma luta de classes. Sem disfarces. Os que têm um pouco menos de comprometimento e um pouco mais de clareza precisam deixar claro que a indignação não pode ser seletiva.

 

Esse é o Brasil que precisa se levantar: o que não está comprometido com nenhum grupo.

 

As questões jurídicas, do que é crime ou não, serão melhor compreendidas quando a fumaça das paixões baixarem.

 

O que fica evidente é que o sistema político brasileiro faliu. As instituições estão por um fio. Resta pouca coisa no que acreditar.

 

A palavra agora é do Supremo Tribunal Federal. Onde têm assento tanto um Gilmar Mendes (conhecido por suas posições políticas) e que apoia Moro e seu modo de agir, quanto um Marco Aurélio Melo, ponderado, equilibrado.

 

É dele a frase: “não há observância da lei só no Paraná”.

 

O show continua, transmitido ao vivo pela TV. A história do Brasil está sendo escrita agora, observada pelo mundo.

 

Nós, que já acreditamos em caçador de marajás, e acreditamos num presidente torneiro mecânico, precisamos parar de fabricar super-heróis. Precisamos assumir o comando do nosso próprio destino. 

 

Duros tempos de uma depuração necessária. Para que surja outro Brasil, depois deste.

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