Pistoleiros destroem roçados e casas de pequenos produtores no Norte do Estado

Conflitos que iniciaram em 1992 teve seu ápice em 2017, quando 550 famílias foram despejadas; Incra iniciou regularização das terras criando assentamentos, criando animosidade de grandes produtores

Em um dos vídeos é possível conferir ação de supostos pistoleiros
Descrição: Em um dos vídeos é possível conferir ação de supostos pistoleiros Crédito: Reprodução

Conflitos em terras da união na região Norte do Tocantins estão sendo registradas com mais intensidade nas últimas duas semanas e, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT) Araguaia-Tocantins, as denuncias formalizadas junto à Polícia Civil não estariam sendo investigadas pela corporação. A tensão atinge, em especial, a comunidade Tauá, localizada a 100 km de Araguaína, próximo ao município Barra do Ouro.

 

De acordo com boletim de ocorrência registrado no dia 25 de julho, uma vítima relatou o crime de "esbulho possessório", onde sua plantação de mandioca, milho, melancia e feijão foi destruída com uso de um trator e relatou, ainda, que moradores de diversas comunidades rurais da região vêm sofrendo ameaças semelhantes.

 

Em carta enviada ao T1 Notícias, a CPT Araguaia-Tocantins relata que, neste tempo, casas e roças de famílias camponesas foram destruídas supostamente “a mando de dois grileiros que tentam expulsar as famílias da região há mais de uma década”.

 

Em um dos vídeos é possível acompanhar a ação dos supostos pistoleiros. Um homem, que aparenta ser o líder do grupo, aparece dando orientações e guiando as ações de outros três rapazes que, com uma moto serra, começa a destruir parte de uma construção.

 

“Integrantes da comunidade também foram ameaçados e intimidados pelos capangas que rondam diariamente dentro da área”, informa a Comissão, destacando um vídeo feito em que um suposto líder do grupo faz ameaças a um camponês. Veja:

 

“Não vamos mexer em nenhum barraco velho, mas não é pra fazer mais nenhum. Os que tiver de 30 dias pra cá vamos derrubar tudo”, afirma o homem em vídeo, ao passo que a pessoa que está filmando pergunta pela autorização ou mandado judicial para ação e o suposto pistoleiro reforça: “o que tiver de barraco novo vamos derrubar, os velhos não vamos mexer, e a justiça vai resolver tudo”. “Então como você vai derrubar minha casa sem autorização da Justiça?!”, questionou.

 

Segundo a CLT, atualmente não há nenhuma ordem judicial que permita a destruição de barracos ou despejo de qualquer morador da comunidade. À contramão dessas atividades criminosas, houve a criação de dois assentamentos através de publicação em portaria oficial do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no início deste ano, e outras 10 áreas estão passando por processos administrativos dentro do Instituto para também serem criados assentamentos.

 

Omissão

 

Por não perceber ações de investigação por parte da Polícia Civil Agrária, no último dia 17 a comunidade de Tauá, com apoio da Comissão, denunciou a situação ao Incra (Ouvidoria Agrária Regional e Nacional), à Defensoria Pública, aos Ministérios Público Federal e Estadual e Polícias Militar e Civil.

 

“A demora do Incra e do Programa Terra Legal em darem rápido andamento às etapas de criação dos assentamentos e regularização fundiária é peça chave para o agravamento dos conflitos. Diversas audiências públicas e reuniões já foram realizadas com esses órgãos, porém, a morosidade e os compromissos não cumpridos impedem a finalização dos processos”, desabafa a Comissão em carta.

 

MPF e DPE

 

O procurador da república Eron Freire dos Santos emitiu um despacho no último dia 20 de julho determinando que o superintendente regional e o chefe da divisão de obtenção de terras do Incra no Tocantins apresentem informações sobre a regularização das terras da união, alvo do conflito, com celeridade. Dá, inclusive, prazo de cinco dias para apresentação das informações solicitadas. “Quanto à adoção de providências, solicita-se que sejam adotadas de imediato”, reforçou.

 

Já a Defensoria Pública Estadual remeteu ofício à 1ª Delegacia Regional de Polícia Civil (DRPC - Araguaína), à Delegacia Especializada em Conflitos Agrários (DECA), ao tenente-coronel do Comando especializado da Polícia Militar Agrária e à Procuradoria dos Direitos do Cidadão no MPF solicitando informações quando ao andamento das investigações.

 

Histórico

 

O conflito na região iniciou em 1992, mas teve seu ápice em 2017 quando cerca de 550 famílias foram despejadas do local por meio de decisão judicial, e outras 829 famílias foram ameaçadas de despejo. Neste período, foram registrados 47 conflitos por terra envolvendo quase 2.500 famílias. As informações são da CPT Araguaia-Tocantins.

 

Polícia Civil

 

À equipe do T1 Notícias, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) informou através de nota que "a Delegacia Especializada na Repressão de Conflitos Agrários (DERCA) tem realizado ações de prevenção a incidentes na Região de Barra do Ouro, inclusive com deslocamento de equipes especializadas até o local, a fim de realizar diligências e investigações necessárias. Em relação aos fatos recentes, já estão sendo tomadas as devidas providências para elucidação do ocorrido".

 

INCRA

 

Confira na íntegra o posicionamento do INCRA em relação à situação relatada acima:

 

A gleba Tauá, no município de Barra do Ouro (TO), é área pública da União sob gestão da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário, a quem compete promover a destinação de áreas públicas federais localizadas nos estados que integram a Amazônia Legal.

 

A Secretaria está promovendo regularização fundiária de áreas na gleba Tauá e já destinou 3.320 hectares ao Incra para criação de dois assentamentos, que ainda serão implantados.

 

A Ouvidoria Agrária Nacional do Incra acompanha os conflitos na Gleba Tauá, tendo solicitado por diversas vezes a atuação da Delegacia Especializada na Repressão de Conflitos Agrários do Estado do Tocantins para apurar os casos de violência relatados na área e encaminhar, se for o caso, os inquéritos concluídos ao Ministério Público para apresentação de denúncias e indiciamento dos acusados de atos ilícitos.

 

Em virtude da denúncia de novos conflitos no município, a Ouvidoria solicitou, em 25 de julho, ao delegado da Polícia Civil em Barra do Ouro informações sobre a instauração de inquérito para investigar os novos relatos de violência. 

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