Palmas 24 anos: a cidade e o espelho dos seus sonhos e desigualdades

Normalmente data de aniversário é sempre um dia de comemorar, de engrandecer as potencialidades, de relembrar as conquistas. Hoje, segunda-feira, 20 de maio aniversário de Palmas...

Palmas: desafios ao longo de 24 anos
Descrição: Palmas: desafios ao longo de 24 anos Crédito: Divulgação

 

Peço licença aos meus leitores para fugir um pouco disso.

 

Em Palmas há 22 dos seus 24 anos -  desembarquei no poeirão da antiga rodoviária, na avenida onde está a Galeria Bela Palma em abril de 1991 – posso testemunhar suas várias fases. E crises.

 

Houve um momento de dúvida sobre a continuidade do crescimento da cidade. Houve um momento de quebradeira geral e muita gente vendendo tudo para ir embora. Houveram tempos em que se podia comprar lotes parcelados direto do governo, em licitações com preço justo.

 

Palmas já foi a cidade do sonho, já foi a capital da expectativa de crescimento, mas perdoem a franqueza: desde o começo, estava fadada a enfrentar os problemas que tem hoje, pela forma como foi implantada.

 

Quando cheguei já tínhamos o apartheid entre ricos(ou ascendentes) e pobres (os trabalhadores da construção). A cidade estava dividida entre Plano Diretor de um lado e Taquaralto e Aureny’s de outro, com Taquaruçu isolada lá em cima da serra, sem asfalto para acesso. Era uma aventura descer aquelas curvas da serra em dias de chuva, numa velha Brasília amarela derrapando.

 

Década de 90: o sonho

 

O governo do Estado, responsável pela sua implantação criou três núcleos habitacionais: a Vila dos Deputados (antiga Arse 14) com uma casa para cada parlamentar em construções pré-moldadas de madeira; a Arse 51, onde foram construídas as primeiras casas de funcionários públicos também de madeira, ao lado do Paço Municipal, e a Arse 72, onde foram construídas casas melhores, já em alvenaria, também entregues a servidores públicos, estes mais graduados.

 

Um grande vazio já foi aberto alí, de pelo menos três quilômetros de extensão, com quadras entregues em “dação de pagamento”, muitas delas até hoje mal ocupadas. A cidade já nasceu obrigatoriamente grande. Forçando o poder público a “esticar” linhas de energia, rede de abastecimento de água e linhas de transporte público. Estava criado um grande problema: a falta de crescimento ordenado da cidade.

 

Se o governo e a prefeitura, juntos, o tivessem construído e determinado ocupação por etapas, será que estaríamos vivendo a selva de pedra que vivemos hoje? Lotes a preços exorbitantes, e a classe C  espremida entre programas sociais como Minha Casa, Minha Vida e os que tem renda para financiar imóveis no centro do Plano Diretor?

 

Uma exceção tem que ser aberta para se falar sobre as Arnos: lá, ainda na gestão do ex-prefeito Eduardo Siqueira Campos, foram colocadas as famílias retiradas da primeira invasão da região Norte: a sapolândia. E  em consequência disto, as Arnos 31, 32 e 33 deram origem ao bairro mais popular dentro do Plano Diretor, uma tendência que até hoje se verifica. É o lugar onde o remediado consegue morar mais perto do Palácio Araguaia. E olha que hoje a valorização avança sobre aquelas quadras até a Arno 72.

 

Novos desafios

 

Mas a cidade cresceu impondo seu ritmo duro, a todos. Uma cidade cara. De custo de vida alto, que começou a melhorar com a chegada das grandes redes.

 

Uma cidade nada ecológica. Palmas, a Capital Ecológica nunca saiu do papel. Seu Código de Obras é um dos mais rigorosos do país. Técnicas ecológicas de construção, como a utilização de tijolos de barro, são proibidas. E o calor que nos consumia, subiu alguns graus a mais com a formação do lago.

 

Lago da UHE do Lajeado, este cujas águas subiram em terreno que não foi limpo a tempo, por imposições intransigentes do MPF, à época capitaneado por Mário Lúcio Avelar. O procurador, inteligentíssimo para algumas coisas, e arcaico para outras, deixou sua marca. Sempre me lembro dele quando vejo os troncos secos e as macrófitas. 

 

Em plenos 24 anos, Palmas é mais do que nunca a capital das desigualdades. De um lado, os servidores públicos federais e estaduais, blindados pelos bons salários e benefícios. É em função deles que gira a roda da economia local.

 

Mas é também a capital da violência crescente, do consumo de drogas avançando nas facilidades de se encontrar o crack. Mais de 600 pontos de venda, segundo o Ministério Público Estadual. Destes que a polícia fecha num dia, e reabrem no dia seguinte do outro lado da mesma rua. Uma endemia que consome a vida das nossas famílias e já não é só a droga de “pedreiro”. Está em todas as camadas sociais.

 

Para onde?

 

Nas últimas eleições, uma população insatisfeita com os resultados do governo estadual -  que afirma estar administrando um estado combalido e literalmente quebrado – elegeu uma incógnita.

 

Este prefeito - que jurou abandonar suas atividades empresariais ao seu competente conselho administrativo  para dedicar-se ao público -  passa o primeiro aniversário da capital em Las Vegas. Numa convenção de donos de shoppings centers.

 

Isso depois de comandar uma ofensiva fiscalizatória para retirar ambulantes, arrancar concessões de quiosqueiros, mudar a prefeitura do Paço (que vai reformar) e colocá-la no metro quadrado mais caro de Palmas, num prédio de alguém que foi símbolo de sua campanha, no discurso de combate a privilégios: Toninho da Miracema.

 

Sim, a data é simbólica. Assim como é simbólico o gesto, a ausência, a Adin proposta para não ter que pedir licença à Câmara Municipal para viajar, e a tentativa de fazer prefeito o secretario Thiago Andrino, dotado de super poderes, enquanto assume oficialmente (pelo menos por enquanto) o curraleiro presidente da Casa, Major Negreiros, vereador eleito apartir de Taquaruçu...

 

São reflexões necessárias quando paramos para nos perguntar para onde vamos.

 

Enfim, aos 24 anos de cidade, em que o comércio reclama de paralisia, o dinheiro público não circula gerando mais empregos na capital, para onde vai esta cidade e a vida de seu povo?

 

Palmas vive hoje talvez um dos momentos mais cruciantes da sua história. Os erros de percurso precisam ser corrigidos. O cuidado com as pessoas precisa estar em primeiro plano. Triste é a cidade que não cuida dos seus.

 

A opção pela industrialização, uma vez que estamos ao lado da ferrovia, é impositiva. O cuidado com a cidade, e suas estruturas, repito, não pode ser mais importante que o cuidado com as pessoas.

 

Ao completar 24 anos, Palmas registra a perda da magia dos primeiros anos. Onde se imaginava que tudo era possível e que um grande futuro nos esperava. Hoje ela repete modelos ultrapassados de desenvolvimento, está engessada por leis que favorecem ao poder econômico e priva as pessoas de qualidade de vida.

 

Então, para onde?

 

Este é o grande desafio desta data: nós que chegamos há 20, há 15, há 12, há 10, há 5 , há dois anos. Todos nós precisamos abraçar Palmas e resgatá-la. Ela é a capital sim, de todos os tocantinenses. Mas sobretudo é nossa. Daqueles que deixaram aqui os melhores anos de suas juventudes. Seu suor e lágrimas derramados.

 

Não vamos abrir mão. Não podemos. Afinal, ela não pertence aos aventureiros. Nunca pertenceu. Ela é nossa.

 

Feliz futuro que formos capazes de construir. É o meu desejo a todos os palmenses.

 

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